Era um garoto que como eu – Engenheiros do Hawaii

Era um garoto que como eu

Bem conhecida no Brasil pela banda Engenheiros do Hawaii, Era um garoto que como eu foi lançada, originalmente, em italiano — C’era un ragazzo che come me — por Gianni Morandi e Franco Migliacci, em 1966. A primeira versão brasileira é de Brancato Jr. e foi gravada em 1967 pela banda Os Incríveis. Somente em 1990 surgiu a versão do Engenheiros do Hawaii.

Era um garoto que como eu
Amava os Beatles e os Rolling Stones
Girava o mundo sempre a cantar
As coisas lindas da América

A música, como quem conta uma história, começa falando de um jovem americano que rodava o mundo vivendo de música. Na época, as bandas Beatles e Rolling Stones estavam no auge do sucesso (sendo até hoje muito conhecidas) e eles eram admirados por milhares de jovens. Na versão italiana da música fala-se explicitamente que o jovem vinha dos Estados Unidos (veniva dagli Stati Uniti d’America).

Não era belo, mas mesmo assim
Havia mil garotas a fim
Cantava help and ticket to ride
Oh! Lady Jane e yesterday

O rapaz retratado na música podia não ser bonito, mas cantando fazia muito sucesso entre as garotas (e provavelmente aproveitava muito desse sucesso). As músicas que ele tocava eram músicas das bandas mencionadas acima, que estavam no topo das paradas de sucesso.

Cantava viva a liberdade
Mas uma carta sem esperar
Da sua guitarra, o separou
Fora chamado na América

Todo o sonho e a liberdade de rodar o mundo tocando suas músicas, no entanto, foram logo interrompidos por uma carta que o convocava de volta ao seu país — Estados Unidos — e a partir daí o jovem teve de se separar de sua guitarra, de sua juventude, de seu sucesso. Na música italiana, o tal jovem americano presenteia quem canta Era um garoto que como eu com sua guitarra (La sua chitarra mi regalò), o que”justificaria” o fato de existir uma música em sua homenagem.

Stop! Com Rolling Stones
Stop! Com Beatles songs
Mandado foi ao Vietnã
Lutar com vietcongs

Muitos jovens norte americanos foram convocados — por meio de cartas como a recebida por nosso jovem músico — a lutar no Vietnã, suprindo as baixas sofridas pelo exército na Guerra do Vietnã, que durou de 1955 a 1975. Eles lutavam contra os Vietcongs, nome dado aos combatentes da Frente Nacional para a Libertação Vietname, que lutava ao lado do exército do Vietnã do Norte. Em português, o uso de “com” em “lutar com vietcongs” torna o verso ambíguo, pois poderia significar que era para o jovem lutar ao lado deles e não contra eles. Em italiano, porém, a música é bem clara: vá ao Vietnã e atire nos Vietcongs (M’han detto “va nel Viet-nam/ E spara ai Viet-cong”).

Era um garoto que como eu
Amava os Beatles e os Rolling Stones
Girava o mundo, mas acabou
Fazendo a guerra no Vietnã

Já deu para perceber que esta é uma letra bem triste e que não podemos esperar boas coisas do final dela… Os jovens iam para a Guerra sem experiência alguma e tinham repulsão a isso. Eles  só queriam paz, queriam continuar suas vidas.

Cabelos longos não usa mais
Não toca a sua guitarra e sim
Um instrumento que sempre dá
A mesma nota, ra-tá-tá-tá

Ao serem convocados para a Guerra, os jovens tinham de raspar seus cabelos e, sem dúvidas, nosso jovem teve de substituir sua querida guitarra por uma arma, cujo som era monótono e repetido pelas armas de todos os outros combatentes.

Não tem amigos, não vê garotas
Só gente morta caindo ao chão
Ao seu país não voltará
Pois está morto no Vietnã

Sozinho na Guerra, sem amigos, sem mulheres, vendo as pessoas morrendo: era essa a realidade dos jovens que iam para a Guerra do Vietnã. Muitos morreram lá e os que retornaram estavam extremamente abalados fisicamente e emocionalmente. Nosso jovem músico teve o destino de muitos: morreu no Vietnã.

Stop! Com Rolling Stones
Stop! Com Beatles songs
No peito, um coração não há
Mas duas medalhas sim

Aos que lutavam na Guerra restava apenas uma coisa: as medalhas de condecoração pelos serviços prestados. Nosso jovem já não tinha mais um coração batendo em seu peito, mas tinha suas medalhas (na música italiana fala-se em duas ou três medalhas: Nel petto un cuore più non ha / ma due medaglie o tre). A música, portanto, termina com uma bela crítica à Guerra e a todo esse infeliz episódio da História.

Uma curiosidade: existe um livro brasileiro chamado Era um garoto, que conta a história de um brasileiro, filho de alemães, que retornou com a família para Berlim durante a adolescência e que foi forçado a integrar o exército de Hitler no final da Segunda Guerra Mundial. O título do livro, apesar de nos remeter à música, não fala sobre a Guerra do Vietnã, mas trata de uma situação semelhante, que tirou a vida de outros milhares de jovens inexperientes (ainda que isso não tenha ocorrido com o protagonista do livro). Se interessou pela obra?Você pode comprar por R$23,30

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