Adelphos – M. Pattal

Título: Adelphos - A revelação
Autor: M. Pattal
Editora: PenDragon
Páginas: 370
Ano: 2016 (1º edição)

Não posso começar essa resenha sem deixar de dizer que me apaixonei por Adelphos. Quando li o prólogo da obra eu quase desanimei, pois não estava entendendo nada: um monte de nomes difíceis, um mundo totalmente diferente do nosso. E olha que até mapa tem nesse livro. Naquele momento, pensei comigo: “a leitura será longa e pedregosa como parece ser esse mundo aí…”. Mas, longe disso, a narrativa de Adelphos me envolveu até a última página e agora tudo o que possa fazer é aguardar ansiosamente uma continuação.

“Todas as vezes que você der o seu melhor, você será considerado o melhor”

Adelphos (p.265)

Os capítulos do livro são curtos e a narrativa é sempre interrompida em um momento perfeito para prender o leitor. Além disso, a história vai alternando entre os passos dos personagens principais e também de outros personagens não menos importantes para o desenrolar dessa história.

“Muitas perguntas, poucas respostas”

Adelphos (p.47)

Logo no começo do livro conhecemos, em primeiro lugar, Enzo, um carioca surdo e praticante de tiro com arco. O jovem sonha participar das Olimpíadas e, para isso, treina duro. Além do tiro com arco, esse personagem também gosta de MMA e de nadar. Por ser surdo, Enzo tem problemas com seu pai, que o despreza por sua deficiência.

Depois de Enzo, somos apresentado a Milena, que será chamada de Mila ao longo de toda a história. Ela mora em Santa Catarina e nasceu com um sério glaucoma que a deixou praticamente cega. Ainda assim, ela treina para participar das Olimpíadas como ginasta. Além disso, Mila também pratica Kitesurf. Mila sofre nas mãos de sua madrasta, que a considera uma incapaz.

Por fim, conhecemos Danilo — ou Dan —, um baiano que perdeu uma das pernas após um acidente e que usa uma prótese. Ele treina para poder competir no atletismo das Olimpíadas, além de gostar de praticar escalada. Ele vive com a avó, pois seu pai o abandonou quando ele nasceu e sua mãe o abandonou depois que ele perdeu a perna.

“Ninguém está neste mundo por acaso, ninguém. Todos nós temos um propósito, mesmo que ainda não saibamos”

Adelphos (p.193)

Com essa “pequena” introdução já podemos perceber que esses três jovens têm muito em comum, apesar de morarem em regiões distintas desse nosso Brasil. Mas as coincidências não param por aí: um belo dia, enquanto estão relaxando em diferentes tipos de águas — Enzo na piscina, Mila na Lagoa e Dan em uma cachoeira — eles avistam uma luz e são sugados por ela….

“Três adolescentes com deficiência, querendo provar que é possível participar das Olimpíadas como outros atletas, chegam a este mundo através das águas. Os três ganham uma marca estranha, poderes estranhos e até agora nenhuma resposta”

Adelphos (p.264)

Essa luz os transporta para um outro mundo. E é nesse mundo que tem aquele monte de nome estranho que vi no prólogo e que eu não estava entendendo nada. Mas, aos poucos, passamos a compreender cada detalhe. Vamos desvendando cada canto desse estranho mundo com Enzo, Mila e Dan e também com os companheiros que eles encontram pelo caminho.

“Ter amigos verdadeiros ao nosso lado ajuda a enfrentar os momentos de dor e sofrimento. A verdade é que precisamos uns dos outros para sermos pessoas melhores”

Adelphos (p.319)

O mundo para o qual eles são transportados chama-se Oykos e está dividido em 12 terras: Kéfali, Láthos, Pólemos, Dásos, Agrótis, Metallórykos, Ámnos, Zóa, Mýga, Sóphos, Neró e Adelphia. Cada uma dessas terras possui um lema e, antes de exemplificar, preciso dizer como esses lemas — e tantas outras passagens do livro — fizeram com que eu enxergasse essa história de maneira metafórica. Mas vamos ao exemplo e daqui a pouco me aprofundo nisso. O lema de Agrótis, a terra que cuida dos grãos e alimentos que servem a todas as outras terras é apresentado e explicado na seguinte passagem:

” — Nosso lema é: ‘Semear, Cuidar, Crescer e Colher’. Isso vale não apenas para os cereais, mas também para as nossas vidas. Tudo o que semeamos na vida, com certeza colheremos”

Adelphos (p.63)

Percebem o porquê de minha leitura metafórica? O trecho acima passa muito bem do concreto para o metafórico, o que nem sempre é tão explícito ao longo do livro. Mas até mesmo Oykos, como um todo, não seria um imenso refúgio necessário para os três jovens que sofrem tanto em suas realidades?

“Mila… terremotos e erupções fazem parte da nossa vida, tanto em relação ao Fotiah, como das dificuldades que enfrentamos na vida. Nem por isso podemos desistir”

Adelphos (p.95)

Mas não se enganem: Oykos está muito longe de ser um mundo perfeito. Ali o bem e o mal estão em constante disputa pela dominação total das terras. A opressão ocupa lugar de destaque, ainda que Oykos tenha tudo para funcionar de maneira harmoniosa.

E se quando mencionei o fato de que em Oykos existem 12 terras você — assim como eu — lembrou-se de Jogos Vorazes, é porque ainda não mencionei os Jogos da Liberdade (que apesar do nome, são horríveis), em que cada terra deve enviar um “tributo” para uma ilha onde vivem os prisioneiros de Oykos e as criaturas que foram totalmente dominadas pelo ódio e pelo mal. Vencem aqueles que conseguirem atravessar a ilha e chegar vivos ao outro lado, o que está bem longe de ser uma tarefa simples.

Já deu para imaginar as encrencas que Enzo, Mila e Dan encontrarão pela frente, não? E é incrível ver como tudo é minimamente pensado e construído nessa história. O livro pode até parecer grande, mas não há uma palavra supérflua ali. Fora as milhares de lições de vida e tapas na cara que recebemos ao longo da leitura.

Eu até diria que esse livro me apareceu no momento certo, mas não acho que existiria um momento “errado” para ele aparecer. Um livro que fala sobre amizade, sobre perdão, sobre superação, sobre empatia… Enfim, um livro que fala sobre tantas coisas bonitas certamente poderá te ajudar nos mais diversos momentos de sua vida, seja uma briga banal, um briga séria, um momento de dor, de reflexão e até em momentos de alegria. Adelphos é uma história que nos reconhece como humanos e que nos faz pensar sobre os poderes que temos por sermos quem somos.

“A prática do amor pressupõe doação. Não apenas doação de tempo, talentos e tesouros mas, principalmente doar de si mesmo para o outro”

Adelphos (p.336)

Se você gosta de histórias de fantasia, mas que sabem mesclar perfeitamente a realidade; se você gosta de livros que te fazem refletir, mas que ao mesmo tempo ajudam a distrair a mente; se você gosta de histórias bem construídas… Esse livro é pra você! Tenho certeza de que Adelphos irá conquistar o coração de jovens e adultos, basta que vocês  acreditem e deixem ele entrar no coração de vocês (assim como deve acontecer com a marca de Pneuma…).

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Allegro em hip-hop – Babi Dewet

Título: Allegro em hip-hop
Autor: Babi Dewet
Editora: Gutenberg
Páginas: 334
Ano: 2018

(Leia ao som de: As quatro estações – Vivaldi)

A série Cidade da Música se passa no Conservatório Margareth Vilela, mas como cada volume conta a história de um personagem diferente, podemos ler os livros na ordem que quisermos. Eu gostei muito de Sonata em punk rock e estava bem ansiosa para Allegro em hip-hop. Ansiedade, aliás, é um elemento muito importante nessa história.

Camila Takahashi — mais conhecida por Mila — é uma jovem bailarina descendente de asiáticos e que sempre deu duro, seja pela cobrança familiar, seja pelo fato de que o ballet era sua maior paixão. Por seu esforço e seu talento, consegue uma bolsa para estudar na Margareth Vilela, um renomado conservatório de música que abriu também um curso de ballet, para que os músicos pudessem tocar para os bailarinos.

“Mila tinha nascido para ser a melhor e não seria nada menos que isso”

Allegro em hip-hop (p.12)

Apesar de se exercitar diariamente e se alimentar de maneira relativamente balanceada, Mila não levava uma vida realmente saudável: ela treinava noite e dia, até não aguentar mais, e mesmo exausta treinava mais um pouco. Ela se cobrava de maneira assustadora e não tirava nenhum tempinho para conhecer um pouco mais sobre si mesma. Ao menos não até que tanta coisa começasse a acontecer em sua vida que ela se viu obrigada a refletir um pouquinho sobre seus sentimentos. E é lindo ver como essa personagem amadurece ao longo do livro.

“Ela não fazia ideia de por que discussões e gritaria sempre a deixavam com a sensação de que estava fazendo algo errado, mesmo que o problema não fosse com ela”

Allegro em hip-hop (p.21)

Ao longo da história vamos acompanhado a progressão dos sintomas da ansiedade de Mila, que passa a ter de compreender o que acontece consigo mesma para poder superar seus próprios obstáculos. O mais interessante deste livro, porém, não é somente o fato de termos uma protagonista com ansiedade (e descendente de asiáticos, ainda por cima), mas também o fato de que ele nos mostra o quanto há pessoas ao nosso redor que estão dispostas a nos ajudar.

Mila, por exemplo, tem uma melhor amiga no Conservatório, chamada Clara. Elas são muito diferentes entre si, em inúmeros aspectos, inclusive na questão familiar: enquanto a família de Camila é extremamente conservadora e tradicional, Clara tem duas mães que, segundo as personagens, são incríveis.

“Sorriu pensando no quanto ela e Clara eram diferentes e como se gostavam mesmo assim”

Allegro em hip-hop (p.50)

É nos corredores da Margareth Vilela que Mila conhece, também, Vitor, um violinista ruivo extremamente paciente, simpático, atrapalhado e compreensível.

“Alguma coisa nele trazia uma sensação reconfortante, como o sentimento de voltar para casa”

Allegro em hip-hop (p.34)

Apesar do romance que se instala entre eles, fazendo Mila repensar diversos aspectos de sua vida, percebemos que esse não é o foco dessa história e que Vitor poderia até aparecer como um simples amigo. A presença dele, no entanto é indispensável, pois é ele quem faz o elo entre o ballet de Mila e o hip-hop de seus amigos músicos.

“O compasso era em Allegro, um andamento musical leve, ligeiro e animado, que normalmente é interpretado com movimentos coreográficos mais rápidos e agitados”

Allegro em hip-hop (p.203)

Mila ainda conta, ao longo do livro, com o apoio do Clube da Diversidade, que faz com que ela enxergue a importância de lutar pelo respeito às minorias e combater os preconceitos cotidianos. Muitos outros personagens também lhe estendem a mão, assim como ela busca sempre fazer o bem aos que estão perto dela. Allegro em hip-hop, portanto, também nos fala muito sobre empatia, como não poderia deixar de ser.

“Era engraçado como a força podia vir de pessoas que nem conhecia ou de pequenos momentos ou detalhes”

Allegro em hip hop (p.116)

Outro ponto interessante da história de Allegro em hip-hop é que apesar de se passar numa escola fictícia, em que convivem apenas músicos e bailarinos, trata-se de uma realidade que podemos encontrar facilmente fora das páginas desse livro. Todos os personagens ali são extremamente palpáveis, cheio de sonhos, sentimentos, medos, vontades. Mas ao colocar tudo isso em um Conservatório, Babi Dewet nos permite conhecer mais a fundo, também, as dificuldades que bailarinos e músicos encontram em sua formação e carreira.

“Aquela velha história de que bailarinas eram pessoas boazinhas e altruístas não era totalmente verdade. Elas eram guerreiras e batalhadoras, que buscavam seu lugar ao sol e deixavam sua marca em uma comunidade disputada por ótimos artistas”

Allegro em hip-hop (p.59)

A única coisa que não me pareceu muito real ou que não entendi muito bem ao longo da história foi o fato dos personagens mostrarem a língua um pro outro o tempo todo! A gente faz isso na vida real em todos aqueles contextos???

A narrativa de Allegro em hip-hop é em terceira pessoa e a maioria dos capítulos, claro, são centrados em Mila, mas há alguns mais voltados para Vitor também. Além disso, podemos encontrar, também, diversos diálogos e mensagens de texto trocados entre os personagens. E claro, não poderia deixar de mencionar que cada capítulo traz como “título” uma música diferente.

Eu poderia passar horas e horas falando sobre esse livro, que realmente me fisgou, mas vou parar por aqui com o pedido de que leiam essa belezura. Quando terminei de ler eu não sabia como reagir. O final da história deixa um enorme gosto de quero/preciso de mais. É um final bem aberto, mas ao mesmo tempo, perfeito para o caminhar da narrativa.

Recomendo muito para quem ama ballet e música; para quem quer compreender melhor aqueles que sofrem de ansiedade; para quem quer um livro que apresenta e representa com responsabilidade minorias; para quem, em resumo, quer ler uma boa história, leve e, ao mesmo tempo, profunda.

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