Enseada negra — Brias Ribeiro

Título: Enseada Negra
Autora: Brias Ribeiro
Editora: Publicação independente
Páginas: 85
Ano: 2020

Na reta final deste ano, fui surpreendida com uma leitura muito interessante: Enseada Negra. Uma história narrada em terceira pessoa e, diferente de muitos livros de autores nacionais que já li, que se passa fora do Brasil, começando na Áustria e passando também pela Alemanha (que na verdade é o país natal da protagonista) e França.

Contudo, o fator mais surpreendente não é o cenário, mas a própria história. Logo no primeiro capítulo somos apresentados à rígida educação de Liesel, a protagonista. E, ao mesmo tempo, vamos percebendo o quanto ela é solitária e reprimida, a ponto de reprimir-se totalmente, em um nível realmente assustador.

“É difícil não acreditar que merece toda a dor física e psicológica que o mundo tem a oferecer”

Por outro lado, logo conhecemos, Grete, alguém que também está naquele contexto repressor, mas que tem uma base familiar muito diferente da de Liesel e que, portanto, ao invés de reprimir-se, contesta e luta, principalmente por aquilo que acredita e por aquilo que é.

No início, Grete é uma pessoa totalmente distante de Liesel, mas logo sentimos que isso pode mudar com os rumos da história. O fato é: nós não poderíamos imaginar o quanto mudaria. Tudo bem, sabendo que se trata de um romance LGBT, podemos desconfiar de algumas coisas, mas tudo acontece de forma muito mais surpreendente que o esperado.

“Por que está sempre preocupando a única pessoa que tem algum apreço por ela? Por que não consegue fazer nada direito?”

Algo que, na minha opinião, contribuiu muito para a atmosfera da história, é a presença de arte nela. Explico: em primeiro lugar, Liesel encontra no desenho uma forma de se expressar. E através de suas obras conseguimos mergulhar — mesmo com a narrativa em terceira pessoa — em seus sentimentos. Além disso, a música é um dos fios condutores da história.

Liesel é totalmente reprimida e fechada, mas é apaixonada por um gênero musical que seus pais certamente abominariam e, mais ainda, um gênero musical que lhe permite extravasar e, também, sair um pouco das regras impostas a ela. E, claro, esse gênero musical é o que a une ainda mais a Grete.

Não sei se pelo fato de Liesel desenhar ou se apenas por mero estilo de escrita, a história é recheada de descrições. Nada, porém, que nos faça morrer de sono. Ao contrário, são descrições que tornam ainda mais reais as cenas apresentadas.

Uma história densa, profunda e diferente. E uma leitura rápida! Vale a pena conhecer Enseada Negra.

E se você tiver ficado com vontade de ler esta história, clique aqui.

Publicidade

Giselle — Thais Rocha

Título: Giselle
Autora: Thais Rocha
Editora: Cartola
Páginas: 135
Ano: 2019

Quando eu cursei Letras, tive sérias dificuldades com as matérias da área de clássicos, o que me criou um bloqueio muito grande com qualquer coisa relacionada a isso e, olhando muito por cima os comentários sobre Giselle, eu havia entendido que ali teria algo deste campo, quando, na verdade, o que havia era algo sobre ballet clássico. Por conta dessa pequena confusão, acabei enrolando um pouco para encarar essa obra… Ah, se arrependimento matasse!

“Ela não tinha nenhuma ideia do que aconteceria a seguir, clichês não eram clichês para ela. Será que existia mais alguém no mundo assim?”

Giselle é um livro maravilhoso e devorei cada página querendo — e não querendo — chegar ao fim dessa história. Uma narrativa envolvente, forte e que me apresentou muita coisa interessante.

“Tudo o que ela mais queria era que o tempo parasse um pouco, que ela conseguisse pensar no que fazer, mas ele insensivelmente continuava seu caminho como se nada estivesse acontecendo com ela”

Vamos começar pelo fato que Giselle não é apenas o título da história, mas também o nome de nossa protagonista e de um ballet de repertório. E claro que, aos poucos, vamos vendo que a escolha não foi ao acaso.

Mas o que é um ballet de repertório?

Em linhas bem gerais — pois não sou nada especialista em ballet — um ballet de repertório é um tipo de ballet que contém uma história dentro dele e tal história, claro, é apresentada ao público através da dança.

O lago dos cisnes e Quebra nozes são alguns ballets de repertório bem conhecidos. E, como dito, Giselle também, mas, ao contrário desses dois que mencionei, este último eu não conhecia até ler a obra da Thais.

E conhecer Giselle — o ballet — através de Giselle — o livro — foi muito bom, pois o que a autora fez foi — sendo bem superficial aqui — nos mostrar como seria essa história se ela se passasse nos dias de hoje.

“Seu primeiro beijo foi absolutamente incrível, a cereja do bolo daquele que fora o melhor dia de toda a sua vida”

A protagonista deste livro é uma jovem apaixonada pelo ballet. Dedica-se com afinco à dança e sonha em se tornar bailarina profissional, para tristeza de sua mãe, que se preocupa com o fato da filha não comer muito e também não levar uma vida normal de adolescente.

“Era normal que uma pessoa fosse assim tão radiante? Ou fora ela quem se enterrara tão fundo dentro de si mesma que já nem sabia mais o que era normal?”

Apesar disso, tudo segue muito bem, até que Giselle conhece Clara que, por sua vez, é filha de bailarinos profissionais. Mas Clara dança ballet por obrigação, porque seus pais desejam que ela se torne uma bailarina como eles.

“Clara tinha razão — suas vidas eram opostas. E por incrível que pareça, ela não se importava”

E nesse contraste entre Giselle e Clara, a história se desenvolve. Apesar das diferenças, ambas logo se tornam amigas, porque, no fundo, só uma pode entender a outra. E é nessa linda amizade que elas vão seguindo em frente, crescendo e amadurecendo.

Porém… Nem tudo são flores e, sem dúvidas, um acontecimento trágico vem para abalar a doçura da história. E é após esse acidente que a autora nos apresenta ainda mais a fundo a história que há por trás do ballet Giselle, traçando um paralelo entre a tradição e a história que ela conta.

“Queria ser feliz ao menos uma vez na sua vida. Seria pedir muito?”

É muito interessante como a Thais conseguiu passar de uma história extremamente verídica e palpável para algo que está mais no plano mitológico, sem que essa passagem ficasse sem sentido ou absurda. É aquele tipo de salto que nos faz pensar “e se fosse assim mesmo?”.

Com este livro eu pude ver um pouco mais de perto como é a rotina e a dedicação de bailarinos à essa dança, pude acompanhar os dilemas de Giselle e Clara, pude refletir sobre assuntos diversos, além de conhecer um pouco mais sobre uma ballet de repertório.

“Clara achou ter escutado seu coração se partir em um milhão de pedacinhos”

Mas, não bastasse tudo isso, o fim também vem como um balde de água fria, deixando uma última e importantíssima lição.

Se você se interessou por esse livro e quer saber qual é a última lição que ele nos deixa, clique aqui.