Não inclui manual de instruções — T. S. Rodriguez

Título: Não inclui manual de instruções  
Autora: T. S. Rodriguez
Editora: Rico Editora
Páginas: 160 páginas
Ano: 2019

É possível falar, em 160 páginas, sobre Síndrome de Asperger, homossexualidade e preconceitos? E mais, é possível fazer isso de maneira que a leitura seja leve, prazerosa? Sim e não para a primeira pergunta e, com ressalvas, sim para a segunda. Vamos entender melhor isso?

“O começo de uma vida e o fim da solidão”

Logo de cara é preciso falar sobre o título: Não inclui manual de instruções. Uma boa escolha para um livro que fala sobre humanos e sobre diferenças. É bem verdade que nenhum de nós nasce com um manual que ensine aos outros como lidar conosco. Mas vivemos em uma sociedade que, muitas vezes, é homogeneizadora e, com isso, sabemos, na maior parte do tempo, agir conforme o esperado ou o que devemos esperar dos outros. E é justamente por causa dessa homogeneização que, infelizmente, temos tanta dificuldade de lidar com aquilo que sai da curva.

“Porque ele se esforça muito para entender as pessoas, mas a maioria delas não faz o mínimo esforço para entendê-lo”

Conor Healy é o protagonista de Não inclui manual de instruções e, logo de início, sabemos que ele é um escritor renomado e que tem Asperger. Ao longo do livro, suas manias e seus hábitos vão nos apresentando um pouco desse mundo.

“A rígida rotina diária era quase tão importante quanto comer ou respirar”

Por outro lado, conhecemos Aidan, um jovem que, com sua irmã, gerencia um tradicional pub irlandês (sim, a história se passa na Irlanda) e que também realiza alguns trabalhos como músico. Por meio desse personagem, nos colocamos na pele de alguém disposto a entender como se relacionar com uma pessoa com síndrome de Asperger.

“Era como se Conor fosse um enigma que ele precisava desvendar. Um grande mistério. Como em seus livros”

Já é de se imaginar, portanto, que ao longo da história haverá algum tipo de relação entre Conor e Aidan, visto que esses são os personagens centrais da história. E, efetivamente, a partir deles desenvolve-se o romance dessa narrativa.

“O amor acontece quando encontramos uma pessoa com quem podemos ser nós mesmos”

Assim sendo, Não inclui manual de instruções consegue falar sobre a Síndrome de Asperger e homossexualidade, mas não chega a se aprofundar nem em um e nem em outro tema. O que não é exatamente um problema, pois creio que essa não era a intenção da obra.

“Pois é, os livros são sua maneira de desvendar o mundo”

O preconceito, claro, permeia esses dois temas: Conor sofrera muito em sua infância, com os colegas de escola, enquanto Aidan vivia longe de sua família desde os 18 anos, porque seu pai não aceitava a homossexualidade do filho. Um tem muito a ensinar ao outro sobre todas essas questões.

“Isso é o que ele precisa. Alguém que tome a mão dele e o faça se sentir corajoso”

Portanto, sim, em 160 páginas, Não inclui manual de instruções consegue falar sobre Asperger, homossexualidade e preconceitos, além de nos apresentar um pouco sobre a Irlanda, mas tudo de maneira superficial.

E por que a leitura é leve e prazerosa, mas com ressalvas? Bem, no geral, foi uma leitura que fluiu muito bem, uma distração muito gostosa. Mas há uma personagem — a mãe — que me deixou com a pulga atrás da orelha, porque ela manipula muita coisa na história, o que enfraquece principalmente a reflexão final do livro.

O final, aliás, foi outro ponto que não curti tanto assim, por tê-lo achado um pouco corrido ou precipitado demais. Ainda assim, não é uma leitura que eu consideraria perda de tempo, muito pelo contrário aliás, gostei de ter passado um tempinho com os personagens dessa obra.

Ficou com vontade de saber mais sobre Conor e Aidan? Então clique aqui.

A diferença invisível — Mademoiselle Caroline e Julie Dachez

Título: A diferença invisível
Original: La différence invisible
Autoras: Mademoiselle Caroline e Julie Dachez
Editora: Nemo
Páginas: 192
Ano: 2017
Tradutor: Renata Silveira

diferença invisível

Eu não sou muito de ler HQ’s e mangás, não por preconceito, mas por falta de hábito e de conhecer histórias nesses estilos que me pareçam interessantes. Mas esse ano me desafiei a ler ao menos uma obra em algum desses estilos e meu namorado logo se colocou à disposição para encontrar algo que me agradasse. E, como sempre, acertou em cheio!

Até agora, com o perdão de estar sendo injusta com os demais livros, essa foi minha melhor leitura de 2020. Isso porque além de trazer um tema pelo qual eu me interesso, tudo é muito bem feito e retratado nessa HQ.

“Escrita por uma jovem com Asperger e alta capacidade intelectual, e ilustrada por uma talentosa desenhista, esta HQ mostra a protagonista, Marguerite, no trabalho, em casa, com seu namorado e depois com seus amigos aspies”

(p. 5)

A diferença invisível nos apresenta uma mulher que somente aos 27 anos descobre que tem Asperger. Mas, ao longo dos quadrinhos, vamos acompanhando essa sua descoberta. Então primeiro conhecemos a personagem, seu cotidiano, seus incômodos.

“Acho que chegamos ao ponto em que posso dizer com certeza que Marguerite está cansada. Cansada de ser julgada o tempo todo. Cansada de tentar ser como as outras pessoas. Pessoas com as quais ela se parece por fora, nada mais. Cansada de tudo isso”

(p. 47)

Uma coisa que chamou muito a minha atenção nesta HQ foi o uso das cores. Muita coisa é em preto e branco e o vermelho é usado em tudo aquilo que incomoda Marguerite (e tantos outros com Asperger). Também há cores mais leves (azul, amarelo), para momentos agradáveis, ou para quando ela sabe que pode ser plenamente ela.

“Autista sim, mas para Marguerite isso não é pejorativo. Sua identidade está completa. Sua fadiga constante, suas dificuldades em compreender as segundas intenções e o subentendido, em manter laços de amizade; tudo isso era perfeitamente explicável. Que alívio”

(p. 123)

A diferença invisível foi uma leitura extremamente leve e importante para mim. Eu consegui realmente mergulhar na leitura, além de apreciar a parte gráfica. Marguerite é uma personagem capaz de nos cativar e, despretensiosamente, nos ensinar muito. Essa foi uma HQ que li com imenso prazer e que acho que todo mundo deveria ler também.

Se você tem curiosidade de conhecer essa história, clique aqui.