O mal das flores — Gabriela Lopes de Azevedo

Título: O mal das flores [monotipias] 
Autoras: Gabriela Lopes de Azevedo e Greta Coutinho
Editora: Urutau
Páginas: 88
Ano: 2023 

Sinopse

Poder tatear um poema, uma flor, uma cidade, alguns corpos, soltos, ou uma casa inteira de mulheres é também poder e precisar confiar no caminho silencioso da transformação. Emergir do atravessamento que a literatura de Gabriela nos causa: impossível sair daqui como éramos antes. O mal das flores, além de nos enganar das possibilidades do asfalto, dos afetos passageiros, das desobediências civis desejadas, também nos seduz a tatear o que a sombra de uma flor nos causa, a textura de um fiapo nos dentes, o peso de existir e carregar o mistério da hereditariedade. Encontrar um rato morto ou a serendipidade no desabrochar do caminho é espalhar raízes confiantes através de versos, seja no escuro solitário de um lago pantanoso, no jardim selvagem ou no “transtorno sonoro da cidade nua”. Gabriela rega isso tão bem que nos convida, com sementes nas mãos, a olhar de perto e cruamente a beleza da força das relações; o abandono, o desejo, o tédio, um roubo na calada da noite, o casamento irrecusável, entranhas adentro, o tísico, o alérgico, os exauridos. Olheiras fundas roxas, inexoráveis fantasmas, unhas quebradas, pelos, celulites. “Mal de ventre, má comida”. Males que te aprisionam com garras quando se apresentam como flores. Depois, uma casa, “concreto afeto cimento”. “Cortinas empoeiradas de rancor”: uma mãe, vendo o entorno de quem nunca esteve ali, uma irmã solteira, desimportante para o amor e atrapalhando heróis, seja ela calada ou tagarela, uma irmã casada que, por tantos motivos, enlouquece; uma avó, uma tia, uma prima. A filha mais velha, a filha mais nova, a maternidade. A aspereza da doença, dos crimes cometidos dentro dos cômodos, da competição sussurrada, quase não dita, das mesquinharias típicas e dolorosas e surpreendentes dos vínculos. Uma leal confusão de afetos. A cidade dentro da família. Verdadeiro laço emaranhado de buquê que a gente compra para si mesma, para abafar as dores e ter esperança num girassol andarilho-da-terra ou numa echinacea laevigata. Que o leitor se prepare para um livro belo, amargo, cheio de delicadezas e assombrações, tudo junto e direcionado em busca de uma fresta em que seja possível entrar a luz.

Greta Coutinho,
artista plástica

Resenha

O mal das flores é um livro não apenas de poesias escritas, mas também de poesia visual, uma vez que a obra conta com algumas monotipias.

Se você, assim como eu, não sabe bem o que são monotipias, aqui vai uma breve explicação, retirada do artigo “Gravura: monotipias e as possibilidades gráficas entre o fazer e o pensar contemporâneo”, disponível aqui.

“A monotipia é um processo gráfico simples, situada num processo intermediário entre a gravura e a pintura ou o desenho, cujas possibilidades envolvem a criação de uma imagem sobre uma superfície em que se coloca tinta ou pigmentos, e, a seguir, é transferida por contato para um suporte. À essa superfície, é possível agregar outros materiais para criar texturas, gestos, formas, marcas. Num sentido amplo, as monotipias devido as suas características diretas e espontâneas, resultam em imagens únicas, aproximando-se das características da gravura, devido a impressão invertida das imagens”

As poesias estão agrupadas em duas seções

  • Vias e veias
  • As flores, o mal

Vias e veias reúne textos que falam de cidades, de vidas que as habitam, dos caminhos que percorremos, das veias que nos preenchem.

“como você vai embora

tão por acaso

como veio

e me deixa aqui

palpitando

de desastres?”

É uma seção múltipla, mas que não deixa de dialogar com a segunda parte, que reúne sobretudo poesias que falam de família (em seus mais variados sentidos e formas).

“No fim das contas

é só

sozinha

casada

e sozinha”

A poesia que dá título ao livro e que revela uma parte importante da obra — isto é, a sua intertextualidade — é muito bonita.

o mal das flores

é nos enganar 

constantemente

nos fazendo acreditar

naquela tolice

bonita

de que algo

ainda pode

nascer

no asfalto”

Mas a minha preferida é, sem dúvidas, a poesia É amor, que brinca com as diversas possibilidades na escrita de uma pichação.

Esta é uma daquelas obras para se apreciar com calma, para que possamos compreender suas referências (que são várias e variadas), degustar suas nuances e nos deleitar com as monotipias que complementam as poesias.

Aliás, a diagramação do livro contribuiu para uma leitura agradável: num papel pólen de gramatura 90, os versos estão dispostos de maneira limpa, brincando com o espaço do papel. A letra e o espaçamento são ideais para uma leitura confortável.

Se quiser adquirir um exemplar da obra, clique abaixo.

Noites Brancas — Gabriela Lopes de Azevedo

Título: Noites Brancas 
Autora: Gabriela Lopes de Azevedo 
Editora: Urutau 
Páginas: 96 
Ano: 2021

Fazia um tempinho que eu não trazia resenha de uma coletânea poética por aqui e fico feliz em voltar com a obra da autora Gabriela Lopes de Azevedo, que já tive a sorte de conhecer.

Pelo título podemos perceber que esse livro trabalha com muita intertextualidade: Noites Brancas é também o nome de um romance de Fiódor Dostoiévski, mas as referências não acabam por aí (e eu provavelmente não consegui pegar nem metade delas, porque essa obra realmente traz muita cultura).

“A gente ficou sem tocar

aquela música”

O livro, com uma bela edição e páginas bem confortáveis para se ler, é dividido em cinco partes:

1. Flânerie noturna

2. Modern Love

3. Casa

4. Noites Brancas

5. Noites Brancas, madrugadas selvagens

Esses subtítulos também já denunciam algo do que encontraremos ao longo dos versos e o que mais gostei nesta obra foi a presença da cidade em meio às palavras.

“A poesia superou 

o cânone

o livro

o mercado editorial”

Noites Brancas é uma obra recheada de sentimentos, ora trazendo melancolia, ora despertando suspiros. E sempre nos fazendo refletir e absorver o que vem e o que foi lido. 

Os versos nos fazem enxergar uma narrativa. Não apenas a narrativa de um personagem qualquer, mas a história de alguém que viveu, amou, estudou e se cercou de pessoas, momentos, acontecimentos.

É engraçada essa sensação, porque não há exatamente um personagem neste livro e, provavelmente, as poesias foram escritas em momentos diversos da vida da autora, mas a forma como elas foram reunidas nos dão essa sensação que nos prende à obra.

Se você acredita que este livro é para você — e dificilmente ele não será pois, como um bom livro de poesias, ele pode ser apreciado aos poucos e, ainda assim, será uma leitura rápida — não deixe de garantir o seu exemplar no site da editora Urutau, ou então de entrar em contato com a autora (Instagram).

Titubeio — Maitê Rosa Alegretti

Título: Titubeio
Autora: Maitê Rosa Alegretti
Editora: Urutau
Ano: 2020
Páginas: 62

Para uma pessoa que lê bem mais prosa do que poesia, até que esse ano (e ainda estamos no primeiro semestre) posso dizer que já li muitos bons versos. Depois da antologia poética Girassol, agora é a vez de uma obra solo, escrita por Maitê Rosa Alegretti.

Ler Titubeio não é apenas uma experiência literária, mas também sensorial. Os versos são impressos como quem dança, e as palavras misturam poesia, sentimento, corpo e natureza.

A obra é bem curta, mas feita para se apreciar aos poucos, um poema por vez, saboreando também o trabalho gráfico do livro, que vai muito além da disposição não convencional dos versos, sendo abraçado por uma capa e uma contracapa extremamente lindas e orelhas muito bem preenchidas pelas belas palavras de Gabriela de Azevedo, também poeta.

O livro é dividido em quatro partes, sendo elas:

  • Titubeio;
  • Observações astronômicas;
  • Maré baixa;
  • Tenho conversado comigo.

Em cada uma das três primeiras partes, na página chapada (aquelas páginas toda pretas que dão um efeito muito bonito) de abertura, além do título há uma epígrafe, de escritores como Chico Alvim, Laura Liuzzi e Fabrício Corsaletti. Na última parte, porém, não há epígrafe alguma e ela é composta por um único poema, que se inicia justamente com “Tenho conversado comigo”.

Eu não teria como escolher uma poesia preferida. Acredito que cada uma carrega a sua beleza, o seu significado e que todas elas juntas é que fazem deste um livro tão singular.

Não conseguindo escolher um poema preferido, portanto, deixo aqui o meu convite para que você conheça a obra inteira e faça o seu mergulho nestas palavras tão bem escolhidas e harmonizadas. O livro pode ser adquirido no site da Editora Urutau. E você pode acompanhar os trabalhos da autora através do Instagram, do Medium ou da Newsletter dela.