Citações #70 — Storia del nuovo cognome

Uma das minhas maiores alegrias recentes com relação à literatura tem sido poder finalmente ler em italiano a tetralogia napolitana, da Elena Ferrante.

Foram anos esperando para ter esses exemplares em mãos e a mesma quantidade de anos fugindo de informações sobre a história, para não perder a magia da leitura. A única coisa que eu sabia era que este era um grande sucesso literário e que provavelmente havia um motivo para isso.

Storia del nuovo cognome é o segundo volume da série e a cada página lida eu tinha mais certeza de que o sucesso era merecido. Em poucos parágrafos muita coisa acontecia e a leitura transcorria entre prender a respiração, ficar chocada e querer falar sobre tudo com qualquer pessoa que aparecesse na minha frente.

A história traz inúmeras temáticas fortes e por mais que eu tenha escrito uma longa resenha sobre esta obra, várias coisas ainda ficaram de fora. Por isso, hoje trago alguns dos trechos que destaquei ao longo da leitura e que gostaria de compartilhar com você.

Como geralmente faço com livros que leio em outras línguas, colocarei os trechos com a minha tradução e, ao final, as passagens originais, na ordem em que aparecerem por aqui.

Uma temática que me parece muito importante na obra da Elena são as relações humanas. Ou melhor, o quão difícil elas são. E digo uma coisa: elas são de uma complexidade assustadora ao longo da história.

“Eu disse a ela: é só nos movermos que erramos, quem entende os homens, ah, quantos aborrecimentos eles nos causam, a abracei com força e parti”

“Nunca me ocorreu, como havia acontecido em outras ocasiões, que ela sentia a necessidade de me humilhar para poder suportar melhor sua própria humilhação”

Storia del nuovo cognome fala, ainda, sobre como as pessoas mudam, se transformam ou simplesmente mostram a sua verdadeira essência, seja ela qual for (o que nos faz amar e odiar os personagens a cada instante).

“Como ela poderia desaparecer assim, sem deixar um vazio?”

“O cinema, os romances, a arte? Como as pessoas mudavam rapidamente, seus interesses, seus sentimentos”

Mais que isso, esta é uma obra sobre a complexidade do amor, principalmente numa sociedade patriarcal e machista, cabendo algumas críticas bem interessantes e bem colocadas ao longo das páginas.

“Pensei que eu era mais sortuda do que Lila, Antonio não era como Stefano. Ele nunca me faria mal, ele só era capaz de fazer mal a si mesmo”

“Imagine se pudéssemos fazer essas coisas, eu e você. Viajar. Trabalhar como garçonetes para nos sustentar. Aprender a falar inglês melhor do que os ingleses. Porque ele pode se dar ao luxo e nós não?”

“Diria que ele derramava sobre todos nós, inclusive sobre mim, a confusão que sentia dentro de si”

“Pensei: o fato de Lila estar casada não é um obstáculo nem para ele nem para ela, e essa constatação me pareceu tão odiosamente verdadeira que meu estômago se revirou, levei a mão à boca”

“‘Você estava destinada a grandes coisas’ ‘Eu as fiz: me casei e tive um filho’ ‘Qualquer um é capaz disso'”

Neste segundo volume também temos a chance de conhecer mais a fundo os personagens do primeiro volume, principalmente as protagonistas, além de conhecer outros personagens, mergulhando cada vez mais em suas características e complexidades.

“Lina, quanto mais cercada de afeto e estima, mais cruel ela pode se tornar”

“Mudei, não na aparência, mas em profundidade”

“Percebi rapidamente que Pietro Airota tinha um futuro e eu não”

Como esta é uma narrativa que nos mostra jovens vivendo como adultos antes do tempo, a história também fala muito sobre juventude.

“Em resumo ele disse que o problema da juventude é a falta de olhos para se ver e sentimentos para se sentir com objetividade”

E, muito relacionado a isso, sobre como nos enxergarmos, tanto no mundo quanto dentro de nós mesmos e o quanto aquilo que nos cerca influencia esta visão.

“Eu odiava a mim mesma, me desprezava”

“Eu não era capaz de confiar em verdadeiros sentimentos. Eu não sabia me deixar levar além dos limites”

“Eu não disse nada sobre mim, ela não disse nada sobre si mesma. Mas as razões dessa lacuna eram muito diferentes”

Por fim, não poderia deixar de mencionar que esta é uma história que a todo momentos ressalta a importância dos estudos, mostrando como o conhecimento pode nos levar adiante e nos fazer conquistar aquilo que sequer imaginamos.

“Eu, Elena Greco, filha de um mero funcionário estatal, aos dezenove anos estava prestes a sair do bairro, prestes a deixar Nápoles. Sozinha”

“Agora tudo o que eu era, eu queria construir por mim mesma”

Espero que estes trechos tenham despertado a sua curiosidade para esta obra, caso ainda não a conheça, ou que tenha te ajudado a matar um pouco da saudade dela.

Para concluir, como prometido, deixo aqui os trechos originais, conforme utilizados ao longo deste post.

“Le dissi: appena ci muoviamo sbagliamo, chi li capisce i maschi, ah, quante noie ci danno, l’abbracciai forte, filai via”

“Non mi venne mai in mente, come invece era accaduto in altre occasioni, che avesse sentito la necessità di umiliarmi per poter sopportare meglio la sua umiliazione”

“Come si poteva svanire così, senza lasciare un vuoto?”

“Il cinema, i romanzi, l’arte? Come cambiavano in fretta le persone, i loro interessi, i loro sentimenti”

“Pensai che ero più fortunata di Lila, Antonio non era come Stefano. Non mi avrebbe fatto mai del male, era capace di farne solo a se stesso”

“Pensa se queste cose le potessimo fare anche io e te. Viaggiare. Fare le cameriere pe mantenerci. Imparare a parlare l’inglese meglio degli inglesi. Perché lui se le può permettere e noi no?”

“Diciamo che rovesciava su tutti noi, anche su di me, la confusione che sentiva dentro”

“Pensai: che Lila sia sposata non è un ostacolo né per lui né per lei, e quella constatazione mi sembrò così odiosamente vera che mi si rivoltò lo stomaco, portai una mano alla bocca”

“‘Eri destinata a cose grandi’ ‘Le ho fatte: mi sono sposata e ho avuto un figlio’ ‘Di questo sono capaci tutti’”

“Lina, tanto più è circondata dall’affetto e dalla stima, tanto più può diventare crudele”

“Sono cambiata non all’apparenza, ma in profondità”

“Capii presto che Pietro Airota aveva un futuro e io no”

“Disse nella sostanza che il problema della gioventù era la mancanza di occhi per vedersi e di sentimenti per sentirsi con oggettività”

“Odiavo piuttosto me stessa, mi disprezzavo”

“Non ero capace di affidarmi a sentimenti veri. Non sapevo farmi trascinare oltre i limiti”

“Io non dissi niente di me, lei niente di sé. Ma le ragioni di quella laconicità erano molto diverse”

“Io, Elena Greco, la figlia dell’usciere, a diciannove anni stavo per tirarmi fuori dal rione, stavo per lasciare Napoli. Da sola”

“Ora tutto ciò che ero volevo ricavarlo da me”

Se quiser saber mais sobre esta obra, não deixe de ler a resenha completa clicando abaixo!

L’Amica Geniale — Elena Ferrante

Título: L’amica geniale - volume primo 
Autora: Elena Ferrante 
Editora: Edizioni E/O 
Páginas: 327 
Ano: 2011 
Título em português: A amiga genial

Finalmente chegou o meu momento de ler a aclamada autora italiana Elena Ferrante (que ninguém sabe exatamente quem é, mas que faz muito sucesso mesmo assim). E não posso deixar de agradecer à minha prima, que, mesmo sem saber, realizou o meu desejo de ler a obra no original.

Apesar de toda a expectativa (foram anos esperando por esse momento), comecei a leitura com dois pés atrás, porque justamente quando peguei o livro para ler, vi mais de uma pessoa relatando que não conseguiu seguir adiante na leitura.

“Experimentei uma sensação que, depois, na minha vida, repetiu-se muitas vezes: a alegria do novo”

Felizmente, fui até o final do primeiro volume desta tetralogia (série de quatro livros) e posso dizer que entendo quem achou o livro chato. Até certo ponto ele realmente é e já vou comentar sobre isso. Mas o livro também é ótimo, e espero conseguir deixar isso igualmente claro, mesmo sem saber muito bem por onde começar a falar tudo o que tenho para falar.

A amiga genial está dividido em duas partes (além do prólogo) e a primeira delas, a infância, é bem arrastada. Para se ter uma ideia, são quase 60 páginas relatando praticamente um único episódio, alternando com um ou outro evento que enriquece a descrição e o detalhamento deste primeiro.

Apesar da monotonia desta primeira parte do livro, ela é necessária para que possamos conhecer os personagens (e são muitos, viu! Tanto é que, no começo do livro, tem um índice dos personagens) e o cenário desta história: uma cidadezinha na periferia de Nápoles, que, por si só, também já é um espaço italiano um tanto quanto complicado, principalmente à época (anos 50).

“Vivíamos em um mundo no qual as crianças e os adultos se feriam com frequência, das feridas saía sangue, que supurava e, às vezes, elas morriam”

A obra é narrada por Elena Greco, mais conhecida por Lenù ou Lenuccia. Passada a parte da infância, é muito interessante acompanhar o seu crescimento e desenvolvimento, ao mesmo tempo que é bem doloroso.

“Talvez eu não seja assim tão feia, pensei, talvez eu só não saiba me enxergar”

Gostei bastante da forma como termina a parte da infância e como, na parte da adolescência, a narrativa foi ficando mais dinâmica e envolvente até que, quando me dei conta, eu só queria saber o que viria a seguir e acompanhar cada passo da Lenù (e, consequentemente, da Lila).

“Quando desapareceu, pareceu que havia sumido a única pessoa em toda a sala capaz de me arrancar dali”

Apesar de Lenù ser a narradora e de ser os seus caminhos que acompanhamos, há outra personagem que ganha destaque nessa história e que é quase tão ou mais protagonista que Lenù: Lila (ou Lina para todos os outros e Raffaella Cerullo como nome de batismo).

“Lila era demais para qualquer um”

A relação dessas duas é uma coisa de doido. Fiquei quase o livro inteiro gritando (na minha cabeça) que a Lila é extremamente tóxica para, no final das contas, até entender o que elas viviam.

“Decidi que eu deveria me inspirar naquela menina, jamais perdê-la de vista, mesmo que ela se irritasse e me expulsasse de perto”

Ler essa narrativa é mergulhar em um cenário italiano complexo: os diálogos são, em sua maioria, em dialeto, nos lembrando deste importante traço cultural. Além disso, ao longo da narrativa, somos apresentados à pobreza, a abusos, ao medo, à violência. Uma Itália muito diferente daquela romantizada em tantas outras histórias.

“Nápoles, de acordo com ele, sempre foi assim: se corta, se parte e depois se recompõe, e o dinheiro corre e cria dificuldades”.

Apesar desta ser uma história difícil, com passagens realmente dolorosas e sensíveis (sim, há gatilhos), ela não deixa de ser bonita, de carregar muitos sonhos, principalmente de uma mudança de vida. Aliás, esta é uma história que se passa em Nápoles, nos anos 50, mas que poderia muito bem se passar no Brasil, em pleno 2022.

“A riqueza, naquele último ano do ensino fundamental, se tornou uma ideia fixa para nós”.

Lenù e Lila são muito diferentes e, ao mesmo tempo, têm tanto em comum. Ao longo das páginas deste livro, vamos justamente unindo os retalhos da colcha que forma suas vidas, encontrando as mesmas cores em alguns pontos e cores opostas, mas complementares, em outros.

A narrativa é realmente tão boa que o livro virou série, em 2018, na HBO. Dizem que ela é bem fiel ao livro, então se você prefere produções audiovisuais, fica a dica para conhecer essa história.

Enquanto isso, eu, como leitora, fui de “socorro, que leitura arrastada”, no início, para “ok, preciso demais dos outros volumes desta tetralogia”. Agora entendo o sucesso desse livro e entro para o time dos que recomendam. Então, se tiver gostado, não deixe de clicar no livro ali embaixo para saber mais.

Como sempre faço quando leio livros em italiano, os trechos inseridos ao longo da resenha foram traduzidos por mim e agora trago os originais, na ordem em que apareceram aqui no post.

“Provai una sensazione che poi nella mia vita s’è ripetuta spesso: la gioia del nuovo”

“Vivevamo in un mondo in cui bambini e adulti si ferivano spesso, dalle ferite usciva il sangue, veniva la suppurazione e a volte morivano”

“Forse non sono così brutta, pensai, forse sono io che non so vedermi”

“Quando sparì mi sembrò che fosse sparita l’unica persona in tutta la sala che aveva l’energia per trascinarmi via”

“Lila era troppo per chiunque”

“Decisi che dovevo regolarmi su quella bambina, non perderla mai di vista, anche se si fosse infastidita e mi avesse scacciata”

“Napoli, secondo lui, era così da sempre: si taglia, si spacca e poi si rifà, e i soldi corrono e si crea fatica”

“La ricchezza, in quell’ultimo anno delle elementari, diventò un nostro chiodo fisso”