O mistério da casa incendiada — Rafael Weschenfelder

Título: O mistério da casa incendiada 
Autor: Rafael Weschenfelder 
Editora: Naci 
Páginas: 336 
Ano: 2023

Sinopse

Foi com um hobby incomum que Gael se tornou um youtuber famoso: visitar casas mal-assombradas. Mas os tempos de glória do Assombrasil parecem ter ficado para trás, e com a queda de visualizações do canal, os patrocinadores ameaçam abandonar o barco. Então quando Sabrina, sua sócia e camerawoman, descola uma semana de estadia na mansão onde os corpos do ex-candidato a prefeito Marcos Gonçalves, esposa e filha foram encontrados carbonizados sem explicação, Gael vislumbra a oportunidade perfeita de reerguer o canal. Mas o que era para ser só mais uma gravação ganha ares sombrios quando ursinhos de pelúcia pegam fogo sozinhos e Gael encontra, no antigo quarto da filha de Marcos, um colar idêntico ao que sua irmã começou a usar antes de morrer. Acreditando que a mesma entidade que a possuiu foi responsável pela chacina da família Gonçalves, Gael fará de tudo para juntar as peças desse intrincado quebra-cabeças envolvendo campanhas eleitorais, igrejas evangélicas e homofobia, e descobrirá que os fantasmas mais assustadores não estão fora, mas dentro de nós.

Resenha

Comecei a leitura de O mistério da casa incendiada com as expectativas lá em cima (um erro, sabemos) e (provavelmente por isso) senti o ritmo um pouco lento.

“Expectativas baixas, eis o segredo da vida”

Para quem leu a sinopse e acompanhou de perto tudo o que rolou antes e durante a pré-venda deste livro, parecia que não havia nada de novo naquelas primeiras páginas, apenas o detalhamento de algo tão aguardado e, por isso mesmo, quase conhecido.

“Mas as questões mais cabeludas demoram a dar as caras. Ficam emboladas no peito e não saem de jeito nenhum”

Aos poucos, porém, a narrativa foi me ganhando e cheguei às últimas páginas abdicando até mesmo de alguns minutos do meu sono (coisa que só faço quando realmente não tenho alternativa ou, neste caso, quando o livro é tão bom que eu PRECISO saber o final).

“Saber que o médium mais poderoso de São Paulo está preocupado com os fantasmas que te assombram definitivamente não é um bom sinal”

Gael, o protagonista e narrador desta história, consegue conduzir a narrativa de maneira que nos sentimos praticamente mergulhando em sua mente, nos tornando uma pessoa muito próxima a ele.

“Tudo o que eu quero é sumir”

Ao longo dos primeiros capítulos temos a oportunidade de nos ambientar à história: conhecemos Gael e Sabrina — sua melhor amiga e camerawoman —, passeamos um pouco por São Paulo e, claro, descobrimos o Assombrasil, o canal para o qual Gael e Sabrina filmam em casas mal assombradas.

“Ultimamente, o gráfico de visualizações do Assombrasil mais parece uma descida de montanha-russa. Mas nem sempre foi assim…”

Numa tentativa de salvar o canal, que fica claro o quão importante é para eles, Sabrina consegue algumas diárias na casa dos Gonçalves, abandonada há 10 anos, após a morte de seus donos: Marcos — candidato à prefeitura de São Paulo que estava subindo nas pesquisas —; Damares, sua esposa; e Jéssica, a filha perfeita. Mas será que perfeição realmente existe quando falamos de seres humanos?

“Não era para ter crianças enterradas em cemitérios”

Ao lado de Gael e Sabrina, a cada página,  vamos buscando entender o que levou àquelas mortes, enquanto visitamos cada cômodo dessa casa aterrorizante.

“A casa dos Gonçalves pode ser assustadora, mas ainda é fichinha perto da que estou prestes a visitar”

Aos poucos, também vamos conhecendo um pouco mais de Gael e logo estamos embarcando na busca dele para entender a relação entre Eloá, sua irmã mais velha que morrera no mesmo dia que Jéssica, os colares idênticos que ambas tinham e alguns mistérios que rondam a sua vida

“— Às vezes nós vemos o que queremos ver, filho”

Tentando fazer as pazes com sua infância, Gael narra um pouco de seu passado, sempre de forma muito intimamente relacionada à irmã.

“Sabe, maninho, o demônio assume várias formas, algumas tão inesperadas que nem dá para desconfiar. A gente pode acabar procurando por ele nos lugares errados, achando o que quer, e não o que é”

E é por meio de tanto mistérios, alguns belos sustos e um bom número de piadinhas infames que Rafael Weschenfelder nos conduz por este livro, que consegue unir ficção e realidade de maneira surpreendente e natural.

“Sem chance, penso, sabendo que pior do que 2018 só mesmo um apocalipse zumbi”

A história também nos faz refletir sobre algumas questões importantes, enquanto nos faz elaborar mil e uma teorias de como tudo isso irá terminar (e olha que somos capazes de imaginar de um tudo, viu).

“— Nem toda doença pode ser tratada por um médico, filho”

Quando menos esperamos, mais uma lição bate à nossa porta. Além de atualidades e reflexões, Rafael consegue inserir algumas críticas interessantes, como a exploração de riquezas em terras que não deveriam ser destruídas pelo capitalismo.

“A gente sabia que não tinha a menor chance contra os fazendeiros, então fechamos um acordo que permitia a exploração de metade da jazida. Funcionou durante algum tempo, mas eles queriam mais. Ele sempre querem mais”

O que nos deixa de queixo caído, no entanto, é o desfecho da história. Que, claro, você só vai descobrir após garantir o seu exemplar (físico ou digital). Mas já deixo um alerta: se comprar o livro físico e não quiser spoilers, não folheie as últimas páginas!

Por falar nisso, a diagramação dele é ótima: leitura confortável do livro físico e detalhes que não escapam aos olhos mesmo quando estamos imersos no texto.

E te garanto: a dedicatória faz cada vez mais sentido depois de concluída esta leitura.

“Para todos aqueles que acreditam em fantasmas, mas acham as pessoas mais assustadoras”

O mistério da casa incendiada vai agradar gregos e troianos (ou místicos e céticos) e vai te garantir bons momentos de leitura.

Para garantir seu exemplar, basta clicar abaixo. E não deixe de seguir o autor em suas redes sociais (Instagram | Twitter) e de fazer parte do seu grupo de leitores no Telegram.

Se quiser conhecer outras obras dele, se liga nestas resenhas:

Depois da caixa preta — Rafael Weschenfelder

Título: Depois da caixa preta
Autor: Rafael Weschenfelder
Editora: Publicação independente
Páginas: 99
Ano: 2022

Será que os fofoqueiros de plantão já pensaram em unir a paixão por reality shows e literatura? Se sim ou se não, a dica de leitura de hoje é um prato cheio para isso e, sem dúvidas, vai agradar não apenas os fãs desse tipo de programa, mas também aqueles que acreditam numa boa teoria da conspiração.

Em Depois da caixa preta conhecemos Lorenzo, um ator de novelas adolescentes que quer entrar na famosa Casa de Vidro não para ganhar dinheiro ou fama, mas para descobrir o que há de verdade na tal caixa preta, único cômodo da casa que não tem câmeras e paredes transparentes.

Acho que só com a breve descrição acima já dá para ter ideia das referências que permeiam esta história, certo?

“A Casa de Vidro muda a gente — diz, por fim. — Você não entenderia”

Uma vez mais, porém, Rafael Weschenfelder surpreende seus leitores. Por trás de uma história que parece a simples busca de um jovem apaixonado pela verdade que mudou por completo o comportamento de sua (ex)namorada, Lisbela, que três anos antes participara desse mesmo programa, o autor esconde muito mais.

Chips, manipulação, insegurança e depressão são alguns dos assuntos que encontramos nas poucas páginas que compõem esta narrativa cujo vilão não tem uma cara precisa, mas faz-se claramente presente.

“Ninguém é livre para fazer suas próprias escolhas dentro da Casa de Vidro. Somos fantoches, marionetes”

Se esta história despertou sua curiosidade, saiba mais sobre ela clicando abaixo. Uma leitura rápida e que, como sempre acontece com os textos do Rafael, vai te prender e, no final, te deixar de boca aberta, pensando em milhares de possibilidades.

Também te convido a seguir o autor no Instagram e conhecer suas outras obras: as 220 mortes de Laura Lins (nessa tem looping temporal) e O baú do zumbi gelado (para quem curte videogame ou jogos online).

Citações #45 — O baú do Zumbi Gelado

Por mais que eu goste de um conto, é difícil sobrarem trechos dele que eu achei interessante e destaquei ao longo da leitura, mas que não usei na resenha. Isso ocorre, principalmente, devido à curta extensão deles.

No entanto, após a resenha de O baú do Zumbi Gelado, escrito por Rafael Weschenfelder, ainda fiquei com alguns quotes que gostaria de trazer para vocês e fico feliz em ter mais uma oportunidade de falar sobre esta obra sensacional!

“Sabe quando você está falando e a palavra certa foge?”

Na resenha eu comento sobre o quanto esse conto surpreende, ainda que haja elementos que — espero eu — podem se tornar marca registrada do autor.

“— Não estou jogando enquanto espero ele acordar. Estou jogando para ele acordar”

É o que acontece, por exemplo, com a naturalidade de Rafael em criar histórias que incluem conhecimentos interessantes, mesmo quando se referem a coisas um pouco mais técnicas, como já comentado na resenha.

“Um dos grandes charmes de Zumbizeira é a inteligência artificial dos NPCs. Com respostas infinitamente mais sofisticadas — e hilárias — que as da Siri da Apple e da Alexa da Amazon, conversar com eles se transformou numa espécie de passatempo para os jogadores”

Ou então com a facilidade que ele tem para criar um humor gostoso de ler.

“Se recuperou o senso de humor, está curada”

Além, claro, do fato dele inserir discussões importantes em suas histórias aparentemente despretensiosas.

“— O mundo te deu as costas. Nada mais justo que dar as costas para o mundo”

Outra característica que adoro encontrar nas histórias que leio e que apareceram muito bem inseridas em O baú do zumbi gelado são elementos do cotidiano, da cultura na qual estou inserida, da realidade em que vivo.

“Nos filmes de terror, sempre tem um cara que não acredita em fantasmas: o cientificozão, que faz piada com o sobrenatural e finge ter sido possuído quando o grupo resolve usar um tabuleiro Ouija para se comunicar com o além. Geralmente é o primeiro a morrer”

Depois de tudo isso, claro que é difícil não querer indicar a leitura de O baú do Zumbi Gelado para todo mundo, né? Então, de novo, se você ainda não leu, fica aqui o meu convite para que você conheça essa história.

“Nos encaramos por um instante. Um equilíbrio prestes a se romper”

O baú do Zumbi Gelado — Rafael Weschenfelder

Título: O baú do Zumbi Gelado
Autor: Rafael Weschenfelder
Editora: Publicação Independente
Páginas: 67
Ano: 2021

Depois do (merecido) sucesso com As 220 mortes de Laura Lins — que inclusive ganha uma surpreendente menção neste conto —, Rafael Weschenfelder volta com outra obra perfeita para conquistar seus leitores: O baú do Zumbi Gelado.

Sabe quando você acha que um autor não tem mais como te surpreender, mas ele vai lá e te surpreende? Pois foi isso que aconteceu com essa leitura, que agora compartilho com você.

“Bem-vindo ao Brechó do Hugo, em que posso ajudá-lo?”

O brechó do Hugo costuma ser tão vazio quanto a loja das Irmãs Ferrugem, mas isso não parece incomodá-lo tanto, já que ele aproveita os momentos entre um cliente e outro para jogar Zumbizeira.

“Hugo 1, Irmãs Ferrugem 0. A clássica disputa entre comerciantes fracassados”

A vida pacata deste protagonista parece mudar quando Estela entra em sua loja pela primeira vez. E, aos poucos, ela vai revelando o que foi realmente fazer ali.

“Não sei se estou viajando em esperar que ela reapareça depois da torta de climão, mas tenho a impressão de que nossa conversa ainda não terminou”

Mas não se engane! Se você acha que, com esses elementos e com a sinopse, consegue prever o final, eu duvido. O autor vai nos conduzindo por essa trama de maneira bem inesperada e criativa.

“Sinto o chão desaparecer sob meus pés ao confirmar minha suspeita: ele não acredita em mim”

Para além disso, o que provavelmente cativa ainda mais o leitor é a linguagem usada, cheia de coloquialidades e termos da que pertencem ao mundo dos jogos e da tecnologia.

“Eu… eu… — digo, entrando no modo tela azul”

E, aos poucos, o autor consegue nos inserir no universo do Zumbizeira, explicando não apenas como o jogo funciona, mas também trazendo um pouco da linguagem técnica desse universo de maneira que mesmo a pessoa mais alheia a ele possa compreender.

“NPCs são personagens que não são controlados por pessoas de verdade, como eu e Estela, mas pela inteligência artificial do jogo. Programados para funções específicas, jamais saem de seus quadrados: o padeiro vende pães, o ferreiro conserta armas e a enfermeira recupera a barrinha de vida dos jogadores”

Mas ainda há outro detalhe extremamente surpreendente neste conto: entre uma brincadeira e outra, uma fantasia e outra, o autor vai inserindo temas importantes e nos faz refletir sobre eles.

“Palavras inflamáveis que me fariam explodir, mas o mundo pisou tanto em mim nos últimos dias que não sobrou nenhum barril de pólvora para contar a história”

Não acredita que tudo o que eu disse até aqui seja possível em uma história tão curta? Então confira com os seus próprios olhos: clique abaixo e aproveite a leitura!

As 220 mortes de Laura Lins — Rafael Weschenfelder

Título: As 220 mortes de Laura Lins
Autor: Rafael Weschenfelder
Editora: Publicação Independente
Páginas: 53
Ano: 2020

Escrever um conto não é uma tarefa tão simples quanto parece, porque não é simplesmente escrever uma histórinha curta e acabou. A “histórinha” precisa ter começo, meio e fim na medida certa. E se tem algo que eu posso dizer é que As 220 mortes de Laura Lins tem exatamente isso. Ok, talvez eu não importasse de ler um pouco mais… Mas isso é pelo que ainda vou apresentar abaixo.

Acho que uma das coisas que surpreende logo de cara neste conto é a linguagem: totalmente acessível. Digo, o conto é escrito numa linguagem adequada aos personagens nele apresentados (dois jovens que estão no ensino médio) e, ao mesmo tempo, é recheado de referências que nos aproximam ainda mais dos acontecimentos e da narrativa. Não é uma história que termina em si mesma, mas que nos abre horizontes.

E aqui pegamos outro ponto crucial: a narrativa. Impossível não ser fisgado por essas páginas. Rafael pegou uma ideia e trabalhou em cima dela de maneira muito criativa, divertida e, apesar de tudo (e vocês já vão entender essa “ressalva”), leve.

Em certo momento da leitura, fiquei pensando se havia uma metáfora por trás daquelas palavras, onde tudo aquilo chegaria. Entendi que não era exatamente uma metáfora, mas havia uma grande mensagem a ser passada e… Uau! Como isso foi muito bem feito.

Mas vamos ao que interessa: antes de começar a leitura da história propriamente dita, somos apresentados a 5 regras. Guarde-as, você logo entenderá cada uma e — provavelmente, ao menos comigo foi assim — achará muito bacana o paralelo ali traçado.

“Nesse jogo, é a mente que fica com as cicatrizes mais profundas”

Os capítulos são nomeados de “ciclos” e isso também logo se explica. Se você olhar o sumário, verá: Ciclo 1, Ciclo 2, Ciclo 3, Ciclo 220, Ciclo 221 e Laura. Não, não é um erro. Lembre-se que estamos falando de um conto e você, ao iniciar a leitura, logo entenderá que não seria possível narrar cada um dos ciclos (eu leria, viu?). Mas por quê?

A cada novo ciclo, Daniel acorda em seu quarto, olha para o celular e vê a mesma data e hora: 17 de maio, 13:23. A cada novo ciclo, Daniel vai se encontrar com Laura no Parque do Ibirapuera. E a cada novo ciclo, Daniel tenta evitar a morte de sua amiga (e falha).

É claro que depois do 3º ciclo, tanto Daniel quanto nós, leitores, já entendemos que ele está preso em um looping temporal. O que não sabemos — e nem ele — é como sair disso.

E apesar disso poder soar repetitivo, não é. Não apenas porque, a cada ciclo, Daniel descobre algo novo, mas também porque somos, aos poucos, apresentados à história dele e de Laura, que é muito mais complexa e instigante do que poderíamos esperar de dois jovens colegiais.

Ok, talvez “instigante” tenha sido um adjetivo exagerado, mas a realidade é retratada ali de maneira tão palpável que não tem como não vermos um filme passando em nossas cabeças.

“Viver a mesma tragédia 219 vezes e não poder conversar com ninguém é demais até para Daniel Trombadinha”

Li esse conto bem rapidamente, torcendo até o último momento por um final feliz. Não posso dizer que cheguei onde esperava, mas o final está realmente muito bem pensando.

E se te deixei com vontade de saber mais sobre essa história, clica aqui.