Storia della bambina perduta — Elena Ferrante

Título: Storia della bambina perduta (História da menina perdida) 
Autora: Elena Ferrante
Editora: Edizioni E/O
Páginas: 451
Ano: 2014

Sinopse

Em História da menina perdida, Lenu retorna ao principal núcleo da série: sua amizade com Lina e o bairro onde cresceu. Ao contar a história da maturidade e da velhice de Lenu e Lina, Elena Ferrante nos faz revisitar os dramas que envolvem a busca incessante pelo amor, a maternidade, o machismo, o envelhecimento físico e mental e a máfia.

O embate que as duas protagonistas travaram entre si durante todas as fases da vida segue ainda mais realista. A amizade, ora redentora, ora doentia, torna-se força motriz de todos os passos de Lenu e Lina e de tudo o que as cerca. A dor que permeou os três livros anteriores também continua, e a sensação de que as amigas fizeram os personagens orbitarem ao seu redor atinge também o leitor, que se sente parte desse universo.

História da menina perdida é o final que o leitor esperava, com a dureza e a força que aprendemos a identificar nas personagens de Ferrante ― sem rodeios. O relato da amizade tóxica de Lenu e Lina, que nos engole como um buraco negro, encerra do modo como prevíamos desde o primeiro livro: uma verdadeira obra de arte do nosso tempo.

Resenha

Chegamos ao quarto e último volume da tetralogia napolitana e confesso que não queria me despedir dessa história. Depois de tantos meses — às vezes indo bem devagar, às vezes lendo sem querer parar — acompanhando a Lenù e seus relatos, fica difícil acreditar que cheguei ao último ponto final dessa aventura.

Uma vez mais, ressalto que esta resenha pode conter spoilers, sobretudo dos volumes anteriores. Mas se você não liga para isso ou já leu essa série, não deixe de conferir também as demais resenhas:

Aproveito para lembrar que as citações que você encontrará por aqui foram traduzidas por mim, uma vez que li a obra em italiano. Os trechos originais estarão ao final da resenha, na ordem em que forem utilizados neste post.

Os avisos aí de cima foram de praxe em todos os posts desta tetralogia, mas confesso que hoje eles também me serviram como uma forma de adiar o tão temido momento: falar sobre História da menina perdida.

“Minto, sim, mas porque você me obriga a te dar uma explicação linear e as explicações lineares são sempre mentiras”

É muito difícil falar sobre uma história que a cada página traz uma surpresa e tantos acontecimentos que não estão ali simplesmente para encher o livro de linhas e mais linhas sem sentido. São acontecimentos que fazem parte de todo um emaranhado tão bem construído que, ao final, nos vemos sendo lembrados de acontecimentos de lá do começo da história que ainda ecoam nos personagens e nos lugares.

“Em que desordem vivíamos, quantos fragmentos de nós mesmos voavam como se viver fosse um explodir em fragmentos”

História da menina perdida se passa principalmente em Napoli, pois neste volume, por diversos motivos — possíveis de se imaginar com o final do terceiro livro — Lenù retorna às origens.

“Aquele confronto fora do normal com a minha mãe deve ter revelado a ele sobre mim, sobre como cresci, muito mais do que eu mesma já tivesse contado e ele imaginado”

Voltar ao rione significa estar novamente próxima a Lina, e ver a dinâmica da amizade delas na vida adulta é muito interessante: ainda é uma amizade complicada, com seus altos e baixos, mas talvez um pouco menos tóxica que na infância.

“Eu havia atribuído a ela, desde a infância, um peso excessivo, e agora me sentia aliviada. Finalmente sentia que aquilo que eu era, não era ela, e vice versa”

Os anos longe, as vivências fora daquela realidade, permitiram uma nova visão do todo para Lenù.

“Por alguns segundos, o irmão de Carmen se tornou o ponto de contato entre o seu mundo cada vez menor e o meu mundo cada vez maior”

Essa nova visão, aliás, serve não apenas para sua relação com Lina, mas com todos aqueles que fizeram parte de sua infância, inclusive sua própria mãe.

“Cada relação intensa entre seres humanos é cheia de armadilhas e, se quisermos que dure, precisamos aprender a evitá-las”

A vida adulta também traz uma clareza sobre fatos que sempre estiveram lá e que desde o primeiro livro são descritos, mas talvez de maneira um pouco confusa: a violência, as relações, a política, a máfia.

“Existem momentos em que tudo aquilo que entra em nossa vida e que parece que fará parte dela para sempre — um império, um partido político, uma fé, um monumento, mas também simplesmente as pessoas que fazem parte do nosso cotidiano — desmorona de maneira totalmente inesperada e bem quando milhares de outras coisas nos pressionam”

A morte ganha ainda mais espaço neste volume, seja porque os anos passaram e as pessoas envelheceram, seja porque a violência, como dito, fica ainda mais clara (e mais forte). Já era de se esperar que muitos personagens morressem, mas, ainda assim, é chocante acompanhar um a um indo embora.

“Queria que ela durasse, mas queria que fosse eu a fazê-la durar”

Com isso, a memória também ganha um peso ainda maior, o que, consequentemente, deixa ainda mais claro que Lenù não é uma narradora confiável: foram quatro volumes de uma história narrada por ela, por aquilo que a memória dela lembrava e por aquilo que ela interpretou de todos os fatos ocorridos.

“Eu havia percebido há tempos que cada um organiza a sua memória como lhe convém, agora me surpreendo a fazê-lo também”

Isso nos leva a outro ponto de extrema importância: o fazer literário. Lenù é, sobretudo, uma escritora. E são diversos os momentos em que se menciona o papel da literatura em nossas vidas.

“Os livros são escritos para se fazer sentir, não para ficar em silêncio”

Do título também pode ser que fique clara uma coisa: a importância do contraste entre o adulto e a criança ao longo deste último volume. Por meio de suas filhas, Lenù (e também os demais personagens de sua infância que se tornam mães e pais) pode enxergar muito daquilo que passara despercebido quando era criança, mas também têm a oportunidade de aprender muito: há lindos diálogos entre elas, que nos fazem refletir um bocado.

“As crianças não têm a nossa rigidez, são elásticos”

O momento em que o título deste volume faz sentido é doloroso, triste, mas importante para marcar mais um ponto de transformação, de amadurecimento e de encaminhamento para a conclusão desta história.

“O que fazer então? Dar razão a ela mais uma vez? Aceitar que ser adulto é parar de se mostrar, é aprender a se esconder até sumir?”

No meio disso tudo, como provavelmente já ficou bem claro, Lenù segue dando peso às relações humanas, sobretudo àquelas românticas (mas não somente), sempre tão complicadas.

“Quantas palavras restam impronunciáveis mesmo entre um casal que se ama, e como é grande o risco que outros a pronunciem, destruindo-os” 

História da menina perdida consegue amarrar as pontas soltas desta tetralogia, ao mesmo tempo em que continua a nos deixar espaço para preencher algumas lacunas necessárias à magia desta narrativa. 

“Nada de estranho, portanto, e nem mesmo de feio. Nino era aquilo que não queria ser e que, contudo, sempre fora”

Trazendo muitas temáticas importantes — para além das citadas aqui, presentes também nos volumes anteriores, a autora ainda nos faz acompanhar os avanços tecnológicos e a aceitação (ou não) daquilo que é diferente para a sociedade — Elena Ferrante conclui a tetralogia napolitana de uma maneira que não decepciona, ainda que eu ache que mais e mais dessa história nunca seria demais.

“Como eu podia pensar em viver com ele se tinha de passar todo o meu tempo vigiando-o?”

Vai garantir o seu exemplar de História da menina perdida? Então clique abaixo!

Trechos originais

“Mento, sì, ma perché mi obblighi a darti una spiegazione lineare, e le spiegazioni lineari sono sempre bugie”

“In quale disordine vivevamo, quanti frammenti di noi stessi schizzavano via come se vivere fosse esplodere in schegge”

“Quello scontro fuori misura con mia madre dovette rivelargli di me, di com’ero cresciuta, più di quanto io stessa gli avessi raccontato e lui si fosse immaginato”

“Le avevo attribuito fin dall’infanzia un peso eccessivo e ora mi sentivo come sgravata. Finalmente sentivo che ciò che ero io non era lei, e viceversa”

“Per qualche secondo il fratello di Carmen diventò il punto di contatto tra il suo mondo sempre più piccolo e il mio mondo sempre più grande”

“Ogni rapporto intenso tra esseri umani è pieno di tagliole e se si vuole che duri bisogna imparare a schivarle”

“Ci sono momenti in cui ciò che si colloca ai lati della nostra vita e che pare le farà da sfondo in eterno — un impero, un partito politico, una fede, un monumento, ma anche semplicemente le persone che fanno parte della nostra quotidianità — viene giù in un modo del tutto inaspettato, e proprio mentre mille altre cose c’incalzano”

“Volevo che lei durasse. Ma volevo essere io a farla durare”

“Mi ero accorta da tempo che ognuno si organizza la memoria come gli conviene, tuttora mi sorprendo a farlo anch’io”

“I libri si scrivono per farsi sentire, non per stare zitti”

“I bambini non hanno le nostre rigidità, sono elastici”

“Che fare dunque? Darle ancora una volta ragione? Accettare che essere adulti è smettere di mostrarsi, è imparare a nascondersi fino a svanire?”

“Quante parole restano impronunciabili anche all’interno di una coppia che si ama, e com’è elevato il rischio che altri le pronuncino distruggendola”

“Niente di alieno, dunque, molto invece di laido. Nino era ciò che non avrebbe voluto essere e che tuttavia era sempre stato”

“Come potevo pensare di vivere insieme a lui se dovevo passare il mio tempo a sovergliarlo?”

Storia di chi fugge e di chi resta — Elena Ferrante

Título: Storia di chi fugge e di chi resta: tempo di mezzo 
Autora: Elena Ferrante 
Editora: E/O Edizioni 
Páginas: 382 
Ano: 2013
Título em português: História de quem foge e de quem fica: tempo intermédio 

Sinopse

A continuação do aclamado A amiga genial. No terceiro volume da série napolitana, Lenù e Lila partem para os embates da vida adulta. Numa sequência angustiante e sem espaço para a inocência de outrora, Elena Ferrante coloca o leitor no meio do turbilhão que se forma das amizades, das relações sociais e dos interesses individuais. História de quem foge e de quem fica é uma obra de arte a respeito do amor, da maternidade, da busca por justiça social e de como é transgressor ser mulher em um mundo comandado pelos homens.

Resenha

Concluída a leitura de mais um volume da tetralogia napolitana, tudo o que consigo pensar é “caramba, não é a toa que isso aqui fez/faz tanto sucesso”. 

Antes de continuar com qualquer comentário, porém, gostaria de lembrar que, em se tratando de uma resenha do terceiro volume de uma série, as chances deste post conter spoilers são altas, então prossiga na leitura por sua conta e risco.

Também aproveito para relembrar que li a história em italiano e que os trechos em português que aparecerem ao longo desta resenha foram traduzidos por mim, estando os originais ao final do post, na ordem que forem utilizados por aqui. E se quiser ler minhas resenhas anteriores, basta clicar aqui e aqui.

Agora sim: vamos ao que interessa!

Neste terceiro volume, temos uma Elena mais madura e, devido ao distanciamento (principalmente físico) de Lina, mais livre das influências (que ainda não vejo com bons olhos, mesmo que agora a Lina esteja levemente menos impalatável para mim) da amiga.

“Sabia com clareza, agora, que cultivar a nossa amizade só era possível se segurássemos nossas línguas”.

Ainda assim, é notável a dependência que nossa autora protagonista tem com relação a esta personagem e o quanto isso molda seu caráter e suas ações.

“Aceitar que eu era uma pessoa mediana”

Os assuntos abordados neste volume não são menos pesados que os vistos anteriormente, se fazendo ainda mais presente as questões políticas da época.

“Bons ou maus, os homens acreditam que cada tarefa deve colocá-los em um pedestal como São Jorge matando o dragão”

Consequentemente, se discute muito sobre máfia e fascismo e o quanto as relações sociais e políticas estão à mercê de forças violentas como essas.

“Quantas pessoas que foram crianças conosco não estavam mais vivas, desaparecidas da superfície terrestre por causa de doença, porque os nervos não aguentaram a dureza dos tormentos, porque o sangue delas foi derramado”

O medo também não poderia deixar de se fazer presente em um contexto tão duro. Lenù teme pelas pessoas que ama, de diferentes formas. Teme por Pietro, por suas filhas, por seus amigos e parentes, por si mesma.

“Assim que eu descia do trem, me movia com cautela nos lugares em que cresci, tomando o cuidado de falar sempre em dialeto, como se para mostrar ‘sou uma de vocês, não me façam mal'”

Ah, sim, nossa protagonista se casa e se torna mãe ao longo deste volume. Também com medo, não só pelas violências, mas por aquilo que ela se tornará a partir do momento em que passar a viver na pele este novo papel: o que ela terá de deixar de lado? O que será da vida dela dali para frente? Ela está pronta para isso?

“Era urgente que eu me habituasse, portanto, àquele novo pertencimento, em especial eu deveria ter consciência dele”

E a solidão bate forte à sua porta. Um retrato fiel do que significa ser mãe para muitas mulheres, ainda hoje.

“eu estava grávida pela segunda vez e, no entanto, vazia”

Inclusive quase não há personagens novos neste livro, ainda que (ou justamente por isso) Lenù viva boa parte da história longe de Napoli.

“Me sentia frágil e sozinha”

Em Storia di chi fugge e di resta continua a se fazer central as relações sociais e os laços que fazemos e desfazemos ao longo da vida.

“Mas o costume de fazer confissões tão bem articuladas, nós duas, com quase vinte e cinco anos, não possuímos”

Este volume começa com a lembrança de que toda a história foi escrita anos depois dos acontecimentos narrados, a partir de um desaparecimento de Lila. Mas ao longo dessas páginas, que logo voltam ao passado que nos está sendo apresentado, percebemos diversos outros momentos de aproximação e afastamento entre Lila e Lenù e também entre outros personagens da série.

“Que lembrança conservava do nosso amor, admitindo que conservasse alguma?”

Em vários momentos somos relembrados, também, do papel central que os estudos têm nesta história. Sua importância para que a protagonista possa ir muito além, o que inclusive dá vida ao título deste livro.

“O essencial era sair de Napoli”

Ao mesmo tempo, porém, há uma forte crítica à “hipocrisia acadêmica”, ao fato de que muito se fala, muito se teoriza, mas pouco há de concreto ali para uma sociedade regida pela violência.

“Vocês professores insistem tanto no estudo porque com isso ganham o pão, mas estudar não serve para nada, nem mesmo nos melhora, pelo contrário, nos torna ainda mais malvados”

E, como não poderia faltar, ainda mais no momento em que Lenù se torna realmente adulta, deixa suas origens, se casa, tem filhos e redescobre o amor, Storia di chi fugge e di chi resta faz boas críticas à sociedade machista em que vivemos. 

“Uma comunidade que acha natural sufocar com o cuidado dos filhos e da casa tanta energia intelectual feminina, é inimiga de si mesma e nem mesmo percebe”

Se você se interessou por este livro, adquira sua edição em português clicando no link ao final deste post. Antes, porém, deixo aqui os trechos originais das passagens usadas ao longo da resenha:

“Sapevo con chiarezza, ormai, che coltivare la nostra amicizia era possibile solo a patto che tenessimo a freno la lingua”

“Accettare che ero una persona media”

“Buoni o cattivi, gli uomini credono tutti che a ogni loro impresa devi metterli su un altare come san Giorgio che ammazza il drago”

“Quante persone che erano state bambine insieme a noi non erano più vive, sparite dalla faccia della terra per malattia, perché la nervatura non aveva retto alla carta vetrata dei tormenti, perché era stato versato il loro sangue”

“Appena scendevo dal treno, mi muovevo con cautela nei luoghi dove ero cresciuta, badando a parlare sempre in dialetto come per segnalare sono dei vostri, non mi fate male”

“Era urgente che mi abituassi dunque a quella nuova appartenenza, soprattutto ne dovevo avere consapevolezza”

“Ero per la seconda volta pregna e tuttavia vuota”

“Mi sentivo fragile e sola”

“Ma la tradizione per confidenze così articolare noi due, a quasi venticinque anni, non ce l’avevamo”

“Che memoria conservava del nostro amore, ammesso che ne conservasse ancora una?”

“L’essenziale era andarmene da Napoli”

“Voi professori insistete tanto sullo studio perché con quello vi guadagnate il pane, ma studiare non serve a niente, e nemmeno migliora, anzi rende ancora più malvagi”

“Una comunità che trova naturale soffocare con la cura dei figli e della casa tante energie intellettuali di donne, è nemica di se stessa e non se ne accorge”

* Lembrando que qualquer compra feita na Amazon a partir dos links postados neste Blog, irá gerar uma comissão para este espaço, sem custo algum para você, ou seja, todos saem felizes nesta história (: