A curiosidade matou o gato? — Diário de leitura (3)

Antes de explicar o título desse post, preciso contar uma coisa para vocês: quando eu conhecia As mil e uma noites só de ouvir falar (isto é, antes de efetivamente pegar esse livro e ler) eu achava que a Sherazade contava as histórias no momento em que ela e o rei iam se deitar e que ele pegava no sono e, por isso, na noite seguinte ela continuava as histórias. Algo não tão absurdo assim se pensarmos que essa coisa de contar histórias para os filhos dormirem é normal no ocidente. Esse livro, porém, não vem de uma cultura ocidental…

Logo de início, portanto, fui surpreendida: todas as manhãs, antes do sol efetivamente raiar, a irmã de Sherazade, que dorme ao lado do rei e da rainha, acorda a irmã e pede para que ela continue a história iniciada na manhã anterior e Sherazade conta, mas, quando vê que o dia já raiou, interrompe a narrativa, lembrando a Shahriar que ele precisa ir cumprir seus deveres de rei, e ele se levanta com a pulga atrás da orelha, curioso para ouvir mais.

Faz muito sentido que seja assim: talvez, se Sherazade contasse as histórias de noite, o rei, na manhã seguinte, já teria perdido parte do entusiasmo por saber mais e acabaria ordenando que matassem sua esposa, dando fim ao plano de nossa protagonista.

Dentre as narrativas que li recentemente, estão “A história do marido e do papagaio”, que foi contada entre as 14º e 15º noites, “A história do vizir punido” (esta um pouco mais longa, durando até a 22º noite) e “A história do jovem rei das ilhas negras” (contada até a 27º noite). Não posso deixar de mencionar que gostei muito de “A história do marido e do papagaio”. De uma forma ou de outra ela foi bem reinventada e repaginada ao longo dos anos, e ainda faz parte de nosso repertório, sendo a base de inúmeras histórias que conhecemos de lições de moral para maridos que não confiam em suas esposas.

Mas o que realmente comecei a pensar lendo essas histórias (e algumas das seguintes, que ainda não mencionarei aqui porque a ligação entre elas não chegou a um fim muito claro) é que, em muitas delas, aparece a questão da curiosidade.

Em diversas narrativas, o personagem principal sofre — ou até mesmo morre — devido à sua curiosidade. Por outro lado, Sherazade só sobrevive porque a curiosidade de Shahriar o impede de matá-la. E é daí que vem o título deste post: afinal, a curiosidade matou o gato? Em alguns casos sim, em outros não. Por quanto tempo, ainda, Sherazade ficará viva graças à essa qualidade?

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3 comentários em “A curiosidade matou o gato? — Diário de leitura (3)

  1. Eu tenho muita dificuldade em abstrair que um livro não é ocidental quando tô lendo! Achei muito válido você fazer um lembrete disso no seu texto porque isso realmente muda muito a leitura que a gente faz do livro, né? E que observação boa essa dela contar de manhã a história e a diferença que isso causa na assimilação do sultão. Inclusive isso me fez pensar muito nos meus próprios hábitos de leitura: eu gosto muito mais de ler de manhã, logo depois do café do que antes de dormir! eu me concentro muito mais e permaneço mais ligada à história… Tô adorando seus posts, Tati!

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    1. A gente tem que ficar se lembrando disso a toda hora, né? Inclusiva, confesso, estou um pouco em falta com isso. Preciso aprender mais sobre a cultural oriental, sobre os costumes da época também!
      Eu gosto bastante de ler a noite, por me sentir mais tranquila com relação aos meus afazeres. Mas aí eu vivo tendo sonhos super malucos hahahahah

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