“Musica leggerissima” o significado da música de Colapesce e Di Martino [tradução 17]

Se tem uma coisa que eu adoro é poder usar música nas minhas aulas. E faço isso não apenas pelo fato de que eu sempre gostei de música, mas também porque é bem comum os próprios alunos pedirem indicações. Então, ao invés de simplesmente jogar um monte de informação de uma vez, vou compartilhando as poucos as músicas que conheço ou vou conhecendo.

Tento sempre buscar músicas que tenham a ver com o assunto da aula em questão ou então que usem muito alguma construção que será trabalhada, o que pode ajudá-los a entender e praticar tal construção. Mas, para não correr o risco de transformar as músicas em um mero instrumento gramatical, também gosto de entender o texto de cada uma, pesquisando seus possíveis significados. É impressionante o quanto já me surpreendi com músicas que diziam muito mais do que parecia em um primeiro momento.

Foi em meio a essas pesquisas que encontrei o texto que traduzirei aqui. Estava procurando sobre Musica leggerissima, uma das participantes do Festival de Sanremo de 2021. Esse é o mais importante festival de música italiana e esta é uma daquelas canções que ficam na nossa cabeça por alguns dias e que dá muita vontade de sair dançando, o que faz jus ao nome da canção.

Para além disso, porém, eu já adorava o fato de que é uma música sobre música e que usa termos do léxico musical — não apenas o leggerissima, que seria um tipo de música e que aqui traduzirei como música pop, mas também termos como crescendo, que pode ser encontrado em partituras, além de nomes de instrumentos musicais e situações nas quais costumamos ouvir música.

Foi só pesquisando um pouco, porém, que percebi que havia muito mais naquelas palavras. E acho que o artigo que traduzirei abaixo, escrito por Eleonora Damiani e publicado em 15 de março de 2021, neste site, já nos dá uma dimensão de como há profundidade em Musica leggerissima.


Italo Calvino dizia que “leveza não é superficialidade, mas planar acima das coisas, não ter pedras no coração”. Encontramos esse mesmo sentido de leveza no texto de Sanremo 2021 de Lorenzo Urcillo, conhecido como Colapesce, e de Antonio Di Martino.

É muito fácil cair na armadilha de etiquetar alguém como “superficial”, não vendo o quanto a pessoa que temos diante de nós está cheia de precisar permanecer na superfície das coisas para sobreviver. De fato, nem todos nós somo dotados de uma máscara e um cilindro de oxigênio que nos permitem descer às profundezas e quando o mar interior se mostra escuro, agitado e cheio de elementos que parecem assustadores, podemos apenas sentir a necessidade de permanecer na superfície. O mesmo vale para quando começa a acabar o fornecimento do cilindro e a pessoa sente a necessidade de subir novamente.

“Cantam-na os soldados, os filhos alcoolizados, os padres progressistas”

Seja o soldado em meio à guerra, seja o filho que depende do álcool, seja o padre que precisa combater pelos direitos humanos em uma Igreja ancorada no julgamento, têm-se em comum um elemento: todos se encontram lutando, seja em casa, seja no trabalho ou no fronte, pelos direitos humanos próprios e dos outros e justamente as lutas mais difíceis são cheias de sangue e lama.

TODOS NÓS TEMOS A NECESSIDADE DE VOLTAR PARA A SUPERFÍCIE

O ser humano não é feito para ficar muito tempo submerso na dor profunda. A mente precisa, de vez em quando, voltar à superfície, tomar um ar e isolar-se em suas zonas confortáveis. O termo “autista”, nos dias de hoje, nos faz imediatamente pensar no Distúrbio do Espectro Autista, mas cada um de nós tem uma zona de conforto, uma pequena zona autista salvadora, na qual podemos encontrar um pouco de espaço para fugir da dor quando ela se torna sufocante. Essa é a mensagem que parece nos transmitir Musica leggerissima: o ser humano precisa flutuar ou surfar sobre uma vivência interna emotiva que poderia nos levar para baixo como os pesos nas laterais de um mergulhador.

O buraco negro é algo que absorve, um lugar indefinido onde podemos nos perder para sempre, mas somente se o vemos assim. Na verdade, por mais que nos assustemos, os nossos lados mais profundos não são buracos negros, mas podem ser percebidos assim porque são intocáveis. As nossas partes escondidas, que fazem parte de nós, são mais parecidas a um abismo e do abismo pode-se voltar, munindo-se das ferramentas necessárias.

COLOQUE UM POUCO DE MÚSICA POP…

Coloque um pouco de música pop porque não estou com vontade de nada, ou melhor, muito pop, palavras sem mistério, alegre mas não muito é o pedido de que está sobrecarregado de vivências interiores pesadas e precisa enlevezar-se, não conseguindo entrar ou permanecer na profundidade.

Nós escavamos o buraco negro quando permitimos que pensamentos depreciativos tomem conta de nós, como repense sua vida, as coisas que você deixou cair no espaço da sua indiferença selvagem. Conseguimos transformar dentro de nós os irreparáveis buracos negros em abismos exploráveis a ponto de poder escutar e aceitar aquela nossa parte que, de tempos em tempos, precisa de música pop?

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4 comentários em ““Musica leggerissima” o significado da música de Colapesce e Di Martino [tradução 17]

  1. Ao começar a ler seu texto, comecei a imaginar, como uma música POP poderia trazer essa profundidade toda. Mas eis que vejo o vídeo e ouvindo a música dá pra sentir mais. Principalmente por ter lido a tua explicação antes. Incrível como saber mais sobre a música pode mudar muito a nossa percepção da mesma! E é clara a influência da euro disco dos anos 80 nestes artistas.

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  2. Tati do céu! Como raios você consegue me dar tantos insights? Li a tradução e ia comentar sobre ela mas fui assistir o vídeo porque putz, essa música é boa demais haha e cara, eu li uma matéria quando essa música saiu, falando sobre como ela é necessária no momento que a gente tá vivendo, justamente com a ideia de música leve, alegre mas nem tanto assim e eu fui unindo isso ao texto que você traduziu e poxa! Me veio tanta coisa! A ideia de tantas mortes e a música pop continuar existindo e existindo e ser mais e mais uma forma de se esconder do mundo, assim como eventos esportivos, novelas, filmes que ficaram por serem lançados e como aos poucos tudo foi virando político e uma forma de pensar o buraco em que a gente se meteu como sociedade. Assistindo agora ao videoclipe, não pela primeira nem pela segunda, percebi o quanto disso eles colocam nas cenas também! O funeral de um cachorro, a moça que sente essa morte e a gente sem entender mas sentindo também, de forma que John Donne e os sinos que dobram por todos nós continuam muito forte nessa pandemia; a espécie de bruxa da Branca de Neve, cujo espelho não mostra a beleza da princesa, mas os desastres do nosso mundo; tudo isso alternado com cenas de programas de auditório e partidas de tênis porque pra quem a vida parou mesmo? E todas as situações que a letra comenta, né? Os alcoólicos, os soldados, a religião… E a ironia que foi Maneskin ter ganho San Remo, uma banda que eu não gostei de cara por ser pop demais e estar viralizando no mundo inteiro. Enfim, coisas demais passando por aqui!

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    1. Eita, mulher! Mas eu só traduzi um texto… hahahahahaha
      Pois bem, é tudo isso aí mesmo, né? E, no final das contas, foi justamente a própria “musica leggera” que fez brotar todas essas reflexões. A vida é meio doida demais mesmo…

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