6 conselhos para melhorar seu italiano inspirados em Jhumpa Lahiri [tradução 40]

Introdução 

É evidente que se eu tiver a oportunidade de juntar coisas que eu gosto, juntarei. E este post é exatamente isso: uma tradução que fala sobre um livro e o aprendizado da língua italiana.

Foi um artigo que encontrei por acaso e que já me deixou muito curiosa para ler o livro que ele apresenta.

O texto original você encontra no Blog Italian With Giada e foi escrito por Giada, em 20 de dezembro de 2023. Abaixo você encontra o post.

Vamos à tradução?


Tradução 

Em outras palavras é o primeiro livro escrito em italiano por Jhumpa Lahiri, uma escritora estadunidense, de origem bengalesa, que se mudou para a Itália e agora vive em Roma. O livro fala da paixão pela língua italiana, de sua beleza, do desejo e da dificuldade de aprendê-la e dominá-la, e, em geral, de como alcançar um objetivo na vida.

Aprender italiano pode ser, às vezes, difícil, mas lendo este livro tenho certeza que você se identificará com o amor da autora pela minha língua e pelo seu percurso de estudo. Nas páginas de Em outras palavras, de fato, você encontrará a paixão e a motivação para a sua viagem linguística. 

Neste post, deixo te deixo seis conselhos para melhorar o seu italiano, inspirados no percurso de estudo de Jhumpa Lahiri.

Boa leitura!!

Conselho 1

Mergulhe, jogue-se na língua! No início você terá medo e não deixará a margem, mas para aprender de verdade é preciso atravessar sem o suporte da sua língua mãe, é preciso mergulhar. Em outras palavras começa exatamente assim, com esta imagem do lago (uma língua estrangeira, neste caso o italiano) e as dificuldades de atravessá-lo, de nadar através dele sem suporte (a nossa língua mãe).

Conselho 2

Não faça tudo sozinho(a)! A beleza de aprender uma língua estrangeira está no seu compartilhamento, nas relações que estabelecemos com pessoas que falam aquela língua, em sua expressão e em sua comunicação. A língua não é uma coleção de regras gramaticais ou uma lista de vocabulários para memorizar. Compartilhe a sua paixão com outras pessoas, procure um professor nativo. Se não, como disse Jhumpa, é como estudar o funcionamento de um instrumento musical sem jamais tocá-lo

Conselho 3

Comece a falar em italiano desde o início, mesmo que você não se sinta perfeito(a) ou confortável ou tenha medo da sua pronúncia e de não ser compreendido(a). Principalmente durante suas viagens à Itália, não hesite em falar italiano.

Conselho 4

Para mergulhar ainda mais na língua, comece pela sua literatura! Leia romances italianos em italiano. Jhumpa, em um certo momento da sua vida, resolve se mudar para Roma. O que ela faz para se preparar para a sua viagem? Renuncia sua língua, o inglês, e seus queridos livros ingleses. Começa a ler só em italiano, romances italianos. Para me preparar decido, seis meses antes da partida, de não ler mais em inglês, ela escreve. Claro, não é simples, mas Jhumpa não se deixa intimidar pela língua e pelas palavras que não entende. Não para a cada palavra, anota aquelas que a afetam, procura entender o significado delas pelo contexto.

Conselho 5

O quinto conselho inspirado na viagem linguística de Jhumpa é aquele de escrever em italiano. A escrita na língua que queremos aprender é fundamental para encontrar a própria identidade, a própria voz naquela língua. Quando aprendemos uma língua estrangeira, nos transformamos e nos reinventamos. Escrever ajuda a encontrar essa voz e nos expressar com novas palavras. 

Conselho 6

O sexto e último conselho tem a ver com as palavras. Quando aprendemos uma nova língua, estamos sempre em busca de palavras novas para nos expressarmos melhor. Para memorizá-las e usá-las, ela anota em um caderno aquelas que parecem importantes, bonitas, incomuns, especiais. São palavras importantes para ela, palavras que leu, escreveu, pensou, às vezes esqueceu e relembrou. São listas de palavras vividas e suas. O meu conselho é esse: não se prenda apenas a listas de palavras pré-fabricadas, que encontramos em manuais, ou criadas por outras pessoas. Crie você mesmo(a) essas listas, faça-as suas, brinquem com elas e as leia, use-as, viva-as. Por exemplo, você pode criar listas temáticas sobre o conteúdo de um livro, de um filme, de um artigo de um jornal, de uma conversa… As palavras novas, neste caso, estão inseridas em um contexto, terão um significado particular para você e, provavelmente, será mais fácil lembrar delas e reutilizá-las no momento certo. 

Se você não leu esse livro e ficou curioso(a), pode encontrá-lo em todas as livrarias. Também é possível encontrá-lo em formato áudio, gratuitamente, no YouTube:

Deixo aqui, também, a entrevista da escritora Jhumpa Lahiri, na qual ela descreve a sua experiência como estudante de italiano.



Conclusão 

Como eu disse no começo, este artigo me deixou com muita vontade de ler Em outras palavras, da autora Jhumpa Lahiri

Antes de encerrar, porém, não poderia deixar de fazer uma última observação: no segundo conselho, a autora do livro sugere ao leitor procurar um professor nativo. Já escrevi sobre isso aqui e reitero: o professor não precisa necessariamente ser nativo, mas precisa saber te fazer entender e usar a língua que você está aprendendo.

E você, que conselhos daria para quem está aprendendo uma nova língua?

Ler faz bem (mas não importa a ninguém) [tradução 39]

Introdução 

Depois de um longo tempo sumida aqui do Blog (falei um pouco sobre isso aqui), finalmente trago um post novo. E, para marcar este retorno, escolhi traduzir um artigo cujo título chamou minha atenção, porque um dos intuitos deste espaço é justamente incentivar a leitura (inclusive, se você conhece alguém que colocou nas metas deste ano ler mais, já convida para conhecer esse espaço e trocar uma ideia).

Desfrute abaixo da tradução de Ler faz bem (mas não importa a ninguém), escrito por Maria Teresa Carbone e publicado originalmente no Il Manifesto, em 8 de agosto de 2024.

Tradução 

Que o hábito da leitura (de livros, não de mensagens de whatsapp) faz bem, é coisa que já se sabe. Mas se por acaso passou despercebido a alguém os infinitos artigos nos quais são elencadas as vantagens físicas e psicológicas escondidas entre as páginas de um romance ou de um ensaio, de uma antologia poética ou mesmo de um bom livro de receitas, eis que María J. García-Rubio e Ana Merino, no La Vanguardia, repropõem o tema à luz das mais recentes descobertas da neurociência.

O ponto de partida, como já havia explicado Maryanne Wolf no seu Proust e il calamaro (Editora Vita e Pensiero), é que ler — diferentemente do caminhar e do falar — não é uma característica inata aos seres humanos, uma vez que a escrita existe há “apenas” seis mil anos. Em outras palavras — explicam García-Rubio e Merino — “do ponto de vista neurocientífico, a leitura não está ligada a áreas cerebrais específicas, como, por outro lado, acontece com a visão, o olfato, a audição”. Este, que poderia parecer um problema, tem, contudo, consequências positivas, porque o cérebro da menina e do menino que aprende a ler é obrigado a encontrar uma — de certo modo inédita — “especialização” que envolve várias regiões cerebrais: “o giro supramarginal, o giro angular, as áreas frontais relacionadas aos processos motores envolvidos na articulação, e as áreas occipitais responsáveis pelo processamento de estímulos visuais como as letras, sem contar as áreas ligadas à memória, ao significado e ao conteúdo emocional dos grafemas e fonemas”.

Em resumo, um treinamento que faz parecer àquele dos atletas para as Olimpíadas uma piada, e que traz consigo, conforme aumenta o nível de complexidade dos textos, outros benefícios em termos de concentração, atenção e capacidade de empatia. De acordo com os últimos estudos sobre o tema, trazem à tona García-Rubio e Merino, a leitura reduz os níveis de estresse, porque “quando lemos são liberados neurotransmissores ‘bons’ como a dopamina e a ocitocina” e “retarda o envelhecimento, graças ao conceito de reserva cognitiva, uma espécie de ‘dispensa do conhecimento’ com a qual o cérebro se reabastece”. 

Diante de dados como esse, poderia-se esperar um assalto generalizado às livrarias e bibliotecas. Ao contrário, infelizmente devo dizer, quanto mais os cientistas demonstram, com estudos em mãos, que a leitura é um salva vidas, menos se lê. E não estamos falando só da Itália onde, sabe-se, a paixão pelos livros nunca foi um esporte de massa, mas de países há anos considerados como paraísos de leitores. 

Os últimos números sobre a leitura dos adultos no Reino Unido são uma dolorosa confirmação disso: como escreve Ella Creamer no Guardian, mostrando os resultados do relatório The State of the Nation’s Adult Reading, 35% dos cidadãos britânicos maiores de 16 anos declara ser um ex leitor, “ou seja, uma pessoa que lia regularmente por prazer, mas agora faz isso raramente ou nunca”. Este é, provavelmente, o dado mais melancólico da pesquisa, mas existe um outro ainda mais inquietante: o grupo etário entre 16 e 24 anos registra o nível mais baixo de leitores regulares (32%). E mais: 44% dos “jovens adultos” declara se considerar um ex leitor.

Para redimir estes desertores da leitura, será suficiente sacudir debaixo dos olhos deles as pesquisas da neurociência? Duvidamos e duvidam também os editores que, na metade de julho (escreve sobre isso Porter Anderson no Publishing Perspectives) na Feira do Livro de Frankfurt e na Feira do Livro para Jovens de Bolonha anunciaram em um comunicado conjunto que “às atividades das feiras para o desenvolvimento do livro serão acrescentados um centro de negócios sobre jogos”. 

Conclusão 

Ler é uma delícia, para além de qualquer benefício que estudos científicos possam descobrir com relação a este hábito. 

É uma pena, portanto, que poucas pessoas tenham consciência disso, mas, principalmente, que haja pouco incentivo para o florescimento deste hábito, ainda que, nos últimos tempos, temos visto redes sociais como o Tik Tok ajudando a disseminar e incentivar este hábito.

Mulheres protagonistas da História: da antiguidade ao século XX [tradução 36]

Introdução 

Já que em março celebra-se o Dia Internacional da Mulher, resolvi que era o momento ideal para traduzir o texto Mulheres protagonistas da História, publicado no site da editora Mondadori em 2022, na rubrica Redação do Oscar, como você pode conferir no link abaixo.

Tradução

Mesmo que muitas vezes não tenham escrito a História, as mulheres sempre foram protagonistas, às vezes involuntárias, às vezes indispensáveis.

Frequentemente eram rainhas (Cleópatra, Caterina De Medici, Maria Teresa da Áustria, czarinas),  ou ainda filhas de um Papa (Lucrezia Borgia), mas também havia quem, como Joana D’Arc, vinha do povo e combatia para o rei, e quem, como Margherita Sarfatti, conhecida como a amante do ditador (Mussolini), tornou-se a primeira crítica de arte mulher na Europa.

Em ocasião da aproximação da Festa da Mulher, decidimos criar uma lista de livros dedicados às mulheres protagonistas da História: da antiguidade ao século XX, dos romances às biografias, passando pelos ensaios.

Mulheres protagonistas da História: da Antiguidade à Idade Moderna 

Antiguidade

Cleópatra: neste livro, Antonio Spinosa soube recompor as duas faces desta soberana bela como uma deusa, mas cega pela ambição; aquela pública, de rainha e também de peão da História, e aquela privada, de mulher de paixões sem medida.

Idade Medieval

Joana D’Arc: na biografia de Franco Cardini a controversa história que envolve o mistério da jovem camponesa guerreira, que se sente chamada por Deus para libertar a sua França dos ingleses, durante a Guerra dos Cem Anos.

Leonor de Arborea: Bianca Pitzorno reconstrói a verdadeira face da mulher que foi capaz de reunir sob uma bandeira as diversas populações sardas que, pela primeira vez, se reconheceram como “nação” e lutaram com sucesso contra os aragoneses.

Idade moderna

Lucrezia Borgia: Geneviéve Chastenet retrata uma jovem mulher cheia de vida que teve de aprender por si mesma que seu destino estava na mão de outras pessoas, vivendo sobretudo em um mundo do qual foi mais vítima que protagonista. 

Caterina De’ Medici: Jean Orieux traça o retrato de uma rainha controversa: uma mulher apaixonada por um homem que não a amava, desprezada pela corte porque era estrangeira e não de sangue real, mas que soube conduzir um dos países mais potentes da Europa com energia e inteligência.

Elizabeth I: Carolly Erickson apresenta a “virgem” soberana que, unindo falta de escrúpulos políticos e punho de ferro, conseguiu, no século XVI, fazer do próprio país o senhor absoluto dos mares e a primeira potência mundial, estabelecendo as bases do império colonial britânico.

Maria I da Inglaterra: Carolly Erickson desmonta o estereótipo de impiedosa tirana ao qual Maria Tudor, a primeira mulher a subir ao trono da Inglaterra, foi condenada, delineando um retrato que contrapõe uma mulher infeliz e sozinha, mas forte e combativa.

Anna Bolena: é sempre Carolly Erickson quem reconstrói os acontecimentos que marcaram a existência desta azarada rainha, usando como pano de fundo uma perfeita reconstituição das relações humanas e da trama de razões pessoais e de Estado, em uma grande corte europeia da Renascença.

Artemisia: nesta biografia de Alexandra Lapierre, revela-se a aventura de uma das primeiras pintoras da história: numa Roma de 1600, a mulher que rompe com todas as normas para conquistar a glória e a liberdade. 

Do iluminismo aos tempos modernos: as mulheres da História

Iluminismo 

Caterina II, da Rússia: Carolly Erickson delineia uma mulher inteligente, amiga e apoiadora dos iluministas, obstinada e corajosa, que conseguiu se impor em um mundo estrangeiro e hostil, superando os preconceitos dos seus contemporâneos.

Maria Teresa da Áustria: Edgarda Ferri reconstrói a biografia de uma mulher fascinante e sensível, corajosa e segura, que soube conciliar o amor pela família com as necessidades do Estado e o exercício do poder, governando “como um homem entre homens”.

Maria Antonietta: Carolly Erickson percorre os passos da rainha que buscou consolação nas elegâncias excêntricas e nos divertimentos mais caros, tornando-se odiada pelos súditos, perseguidos pelas taxas e pelo péssimo governo durante os últimos anos conturbados do Antigo Regime e o início violento da Revolução. 

Séculos XIX e XX

La czarina Alessandra: desta figura enigmática e do seu mundo interior, de um isolamento atormentado, Carolly Erickson  traça um retrato inesquecível da rainha da Rússia antes da Revolução: uma história cada vez mais sombria, que se conclui com o trágico assassinato dos Romanov.

Margherita Sarfatti: a maior parte do público a conhece apenas como “a amante do ditador”, mas Rachele Ferrario reconstrói o temperamento de uma mulher culta, elegante, refinada e sobretudo livre, que conseguiu se impor na cena cultural e completar o seu projeto.

A imperatriz Sissi: Erika Bestenreiner conta sobre uma das figuras femininas mais amadas e contadas da história moderna, reconstruindo também os acontecimentos menos conhecidos, mas não menos tumultuados e singulares, que a caracterizam.

Rosa Parks: Minha história é a autobiografia da mulher símbolo da luta pelos direitos civis que, com palavras comoventes, uma linguagem simples e sinceridade, conta a própria vida e o seu papel na construção de uma sociedade mais justa para todos os americanos.

Herdeira que se tornou rainha por acaso, princesa que subiu numa árvore a noite para descer dele no dia seguinte como rainha. Quatro casamentos e um funeral que marcaram a sua monarquia: é Elisabetta II, 1926-2022, uma rainha como nenhuma outra.

Conclusão

Infelizmente, muitas das biografias elencadas ao longo do post original, não estão traduzidas para o português ou são difíceis de encontrar no Brasil. No entanto, trata-se de uma interessante lista de mulheres que tiveram — e ainda têm — seu papel na História.

Qual dessas histórias você teria interesse de ler ou qual dessas mulheres você conhece um pouco mais a fundo?

O que é a literatura? [tradução 33]

Considerações iniciais

O texto de hoje é a tradução de um artigo originalmente publicado no The nerd writer, em 27 de fevereiro de 2020. O texto em questão foi escrito por Sara Elisa Riva e você pode lê-lo (e escutá-lo!) aqui.

Resolvi trazê-lo para cá pois, como o próprio texto diz, “o que é a literatura?” é uma pergunta que, mais cedo ou mais tarde, os amantes (e estudiosos) desta arte acabam se fazendo.

Além disso, as palavras aqui trazidas também abordam outra questão, que esteve em pauta na minha última resenha: a do cânone literário.

Vamos, então, atrás de algumas respostas?


Tradução

Depois de finalmente compreender qual era o meu papel na difusão da cultura literária, me vi diante de um primeiro obstáculo a ser superado: de onde partir para envolver as pessoas no extraordinário mundo da literatura e da escrita? Do início, obviamente, alguém poderia dizer, mas qual é exatamente o início?

Todos nós começamos a ler sem nos fazermos grandes questionamentos, simplesmente pegamos em mãos o nosso primeiro livro e, uma sílaba depois da outra, uma palavra depois da outra, uma frase depois da outra, chegamos ao final do texto. Lemos a nossa primeira história.

Entretanto — e isso inclui tudo o que lemos a seguir — dificilmente paramos para pensar porque lemos aquele livro específico. E, para compreender isso, temos de dar um passo para trás.

O que é a literatura?

Cedo ou tarde, pelo menos uma vez na vida, um estudioso de literatura se fará a uma pergunta que não temos como escapar: o que é a literatura? Questão aparentemente banal, afinal o que é a literatura se não um amontoado de textos literários?

Começo dividindo a literatura em duas grandes categorias: os grandes clássicos da literatura mundial de um lado (e esses serão os textos aos quais irei me referir ao longo desse texto) e as narrativas contemporâneas de outro. É claro que alguns livros publicados hoje, amanhã podem se tornar clássicos. Vejamos como.

Partindo de “a literatura é um conjunto de textos literários que atravessam os séculos”. Se assumirmos como verdadeira essa afirmação, será natural nos colocarmos outra pergunta: quais são os textos literários que foram transmitidos até nós? E por que justo eles?

O cânone literário

Os textos que nós lemos, que usamos como referência, fazem parte daquilo que é definido como cânone literário, ou seja, um conjunto de autores e obras tidos como modelos estéticos de uma determinada tradição e com os quais abre-se continuamente um diálogo.

Isso vale como uma definição de máxima, mas o cânone também compreende modelos que transcendem a estética. Como, por exemplo, os valores identitários de uma comunidade, os valores éticos e a sensação de pertencimento são fundamentais, uma vez que representam o primeiro sinal de identidade.

Tudo aquilo trazido até este momento clarifica, apenas em linhas gerais, um modelo de representação da realidade externa a nós. O cânone, contudo, fornece também um exemplo do universo íntimo do eu, da interioridade, do pensamento e da memória.

Para que serve, concretamente, o cânone literário?

O cânone literário nos permite, portanto, através da imitação, definir os diversos modos de representação. Em outras palavras: quando lemos os textos que pertencem ao cânone vigente, passamos a conhecer uma série de valores que se tornam nossos através da imitação (a mimese, portanto). Assim sendo, a literatura nos apresenta modelos de comportamento aceitáveis e compreendidos pela sociedade na qual vivemos, nos fazendo viver uma série de experiências capazes de formar a nossa identidade.

Isso nos faz entender que com a variação dos valores sociais no decorrer dos séculos, existe a possibilidade de uma mudança no cânone que, realmente, não é fixo e nem imutável.

Então o que é a literatura?

Depois de esclarecer, em linhas gerais, o que é um cânone literário e de nos colocarmos algumas perguntas, podemos dizer com razoável certeza que a literatura é um conjunto de textos que contém os valores e os modelos da sociedade na qual estamos inseridos, com a qual mantemos um constante diálogo aberto, mas que, no entanto, justamente pelas variáveis típicas da natureza humana, podem ser modificadas com o passar dos anos. Não é um mistério, portanto, que alguns autores ou suas obras tenham caído no esquecimento por longos períodos para depois serem redescobertos e trazidos à luz em um momento mais adequado a receber a mensagem que o autor trazia consigo. 

Resta ainda uma dúvida, a mais complexa, mas talvez a mais interessante: para o que serve a literatura?

Disso, porém, falaremos no próximo artigo!

Por enquanto, aconselhamos uma leitura fundamental: o cânone ocidental, de Harold Bloom.


Considerações finais

Ao concluir a leitura (e a tradução) de O que é a literatura não sei se as coisas ficaram mais claras ou mais confusas para mim.

A verdade é que definir literatura em poucas linhas é uma tarefa ingrata e praticamente impossível.

No entanto, o texto traz uma explicação interessante sobre o que é um cânone e como ele é estabelecido, além de trazer à luz algumas reflexões interessantes sobre a literatura.

Se você quiser a tradução do artigo sobre para que serve a literatura, me fale nos comentários (:

Por que acumulamos livros sem lê-los? [tradução 32]

Introdução

Dia desses, para variar, eclodiu uma polêmica no Twitter, que o Fabiano já comentou neste post, sobre ter ou não livros em casa.

A ideia deste post não é alimentar a polêmica em si, mas trazer uma tradução sobre o acúmulo de livros, que muitas vezes é mais forte que nós. Será que existe explicação para isso?

Ao longo do texto, você irá se deparar com uma palavra em japonês que não era novidade para mim, uma vez que a conheci em Lost in translation, mas cujo significado fica, agora, ainda mais claro.

O texto original foi retirado do wired.it e foi publicado em janeiro de 2023, tendo sido escrito por Maria Francesca Amodeo, como você pode conferir aqui.


Tradução

Esta pergunta é o centro de memes que circulam online; aparece com frequência nas conversas entre leitores e incomoda cada comprador que não consegue parar de comprar novos livros. Uma palavra japonesa nos ajuda a entender este fenômeno.

É uma prática muito mais difundida do que se pode imaginar — no mundo inteiro e também no nosso país — a de comprar livros e acumulá-los, adiando sua leitura. Parece uma crença besta, que muitas vezes é utilizada como uma acusação irônica nos confrontos dos leitores apaixonados (ou que se torna real com os memes), mas é pura verdade, às vezes de forma patológica: muitas pessoas não conseguem parar de comprar livros. Mesmo se já possuem o suficiente para aplacar — ao menos num curto espaço de tempo — sua sede de leitor.

Esses indivíduos acabam por encher as cômodas, os móveis da casa, as prateleiras, as escrivaninhas. Saem por aí e não são capazes de bloquear o impulso de comprar novos livros, mesmo já tendo volumes suficientes à disposição no interior do próprio apartamento. E esta é uma prática que se repete de novo e de novo, em um loop que não faz menção de ceder.

Alguns entram na livraria e, passeando entre as prateleiras, encantam-se com um título ou uma capa e sentem a necessidade de comprar; mas tem também quem segue os canais de editoras mais conhecidas, fica sempre informado dos lançamentos e compra online as publicações recentes que atiçam a sua curiosidade.

Tem também aqueles que não saem de casa com a intenção de comprar um livro, mas que simplesmente não sabem resistir ao bom perfume das páginas novas quando, por acaso, trombam com elas. Ou quem, por outro lado, não tem interesse no conteúdo e só tem a mania de possuir os volumes. E, ainda, há aqueles que amam colecionar edições preciosas e raras dos livros mais famosos do mundo.

As motivações que levam à aquisição de livros são, portanto, diferentes (ou ao menos assim parece), mas o resultado é o mesmo: na casa de cada um desses compradores compulsivos existem altas — e provavelmente empoeiradas — pilhas de livros para serem lidos. Montes de páginas que reduzem o espaço vital à disposição (como já diria Marie Kondo) e que ficam esquecidas por meses, até por anos.

O risco maior, não é nem preciso dizer, é que com a sede de dedicar-se a novas aquisições, os velhos volumes que já possuímos acabem no esquecimento e nunca sejam realmente lidos. Mesmo quando pareciam interessantes no momento da compra.

E então, por que tantas pessoas continuam a comprar livros sem parar, ficando com uma montanha de livros não lidos em casa? As possíveis respostas para este pergunta talvez sejam três.

Há quem sofra de bibliomania

A primeira resposta se refere a uma verdadeira patologia. A bibliomania é, de fato, um distúrbio obsessivo-compulsivo clinicamente reconhecido, que motiva a pessoa que sofre disso a comprar compulsivamente livros que não tem intenção alguma de ler. Neste caso, o sujeito tem como único interesse aquele de rodear-se de volumes de sua propriedade: novos, usados, muitas vezes até em versões duplas ou triplas. Não é nada incomum, de fato, que o bibliomaníaco possua cópias de um mesmo título, porque para ele não é o conteúdo de cada livro que conta, mas apenas o fato de ser proprietário da maior quantidade possível de volumes.

Se trata, neste caso, de uma mania e quem sofre disso muitas vezes tem inclusive problemas relacionais. É de tal maneira dedicado à sua obsessão de acumulador que é capaz de comprometer sua própria saúde. Por isso que quem sofre de bibliomania é tratado com remédios e terapias específicas.

A bibliofilia e o colecionismo

Bem diferente é a bibliofilia que, como é fácil compreender retomando as origens gregas do termo, nada mais é do que o profundo amor aos livros. Geralmente o bibliófilo também possui muitos exemplares, mas ele se empenha em ler todos eles e tende a conseguir. A sua, de fato, é uma sede por conhecimento, para além de um amor real pela leitura de volumes físicos de páginas ásperas. 

Normalmente o bibliófilo é também um colecionador e privilegia, por isso, edições raras de livros famosos, cópias autografadas de seus autores preferidos ou volumes fora de catálogo que não se encontram mais à venda. Amando de maneira realmente visceral até mesmo a encadernação e a capa de cada volume, quem se considera um bibliófilo não pode achar mais sem sentido a tendência de design na qual se colocam estantes e prateleiras de casa cheias de livros expostos com as páginas à vista, em uma infinita extensão de bege. A bibliofilia não é absolutamente considerada uma condição patológica.

A resposta definitiva: o Tsundoku

Igualmente comum — ainda que venha confundida com a bibliomania — é a condição do Tsundoku. O termo deriva do antigo dialeto japonês e une três diferentes palavras: tsunade (amontoar as coisas, acumular), doku (ler) e oku (deixar um pouco para lá). Em resumo, portanto: acumular livros e esquecê-los deles. O termo em uso no Oriente desde 1879 para definir uma tendência que acompanha a humanidade desde a Idade Medieval.

Esta prática, muito mais difundida que as duas primeiras, diz respeito a todas aquelas pessoas que compram livros com a real intenção de lê-los. Os depositam nas prateleiras (ou sobre a cômoda, ou em qualquer lugar da casa) à espera de iniciar a leitura e depois o abandonam por um tempo indefinido. Mas por quê?

Porque no intervalo, compram novos volumes que roubam o interesse deles. E, num certo ponto, porém, parte dos “novos” livros se tornaram datados, porque serão substituídos e ultrapassados por aquisições ainda mais recentes.

Vejamos um exemplo: se uma pessoa que tende ao Tsundoku compra dez livros, começará — na melhor das hipóteses — a ler um num curto espaço de tempo, e deixará os outros nove à espera, na estante. Muito provavelmente, enquanto está empenhado em sua leitura, sua curiosidade será capturada por outros volumes que resolverá comprar. Digamos que quatro, apenas para exemplificar. 

Um desses talvez se transforme em sua próxima leitura. Os outros três, contudo, entrarão na famosa “pilha da vergonha dos livros não lidos”, com os outros nove livros anteriores e sabe-se lá quantos outros mais. E assim por diante, possivelmente infinitamente. 

Os benefícios do Tsundoku

O Tsundoku, porém, não é considerado uma prática negativa. Vale dizer, porém, que se refere sobretudo àqueles que, geralmente, são definidos como leitores fortes, ou seja, aqueles que leram pelo menos 12 livros no espaço de um ano.

Estima-se que em 2022, na Itália, os leitores fortes eram de apenas 15,2% da população, um percentual realmente baixo. Saber que o mercado editorial pode contar pelo menos com uma base de fortes apaixonados que continuarão a comprar livros é, contudo, uma boa notícia.

Mas comprar livros, para além do fato que serão lidos ou não, traz benefícios para a saúde também. O simples gesto de comprar um objeto — como já foi demonstrado por diversas pesquisas conduzidas na última década — melhora o humor de quem compra. E se se trata de livros, há ainda mais um ponto a favor.

O escritor estadunidense Alfred Edward Newton, que viveu entre os séculos XIX e XX e se definia um bibliófilo defendia que “mesmo quando não podemos lê-los, a presença dos livros que possuímos produz uma forma de êxtase: a compra de mais livros do que podemos ler é nada menos que uma tentativa da alma de se aproximar do infinito. Apreciamos os livros mesmo quando não os lemos, o simples fato de tê-lo e saber que estão perto nos deixa mais cômodos. Só de saber que estão disponíveis nos passa segurança”. 

Ter em casa livros, olhar para eles, cheirá-los (sim, tem quem o faça) é, de fato — para quem os ama — uma espécie de remédio para a tristeza. Uma cura para as pequenas, grandes feridas cotidianas, oferecida por uma especial e única sensação de expectativa que se esconde entre as páginas desconhecidas.


Agora me conte aqui: você compra livros e mais livros, mesmo sem saber onde guardá-los? Ou já consegue resistir a esse impulso?

Algumas palavras “intraduzíveis” em outras línguas [tradução 31]

Aproveitando o barco da resenha desta semana, e com uma pequena (alta) dose de loucura, hoje eu resolvi traduzir um artigo sobre palavras italianas que não têm tradução em outras línguas. Contraditório? Talvez! Mas fique até o final para entender como isso seria possível.

Cheguei ao texto em questão através da newsletter da Treccani, a famosa enciclopédia italiana. Ele foi escrito por Eva Luna Mascolino, tendo sido publicado originalmente em novembro de 2022, no illibbraio.it.

E aí, me acompanha neste desafio?


Como traduzir uma palavra que serve de reforço, como “mica” ou a interjeição “boh”, sem recorrer a uma perífrase? E como explicar conceitos como o de “meriggiare”, de “struggimento” ou de “abbiocco” para quem não fala a nossa língua? Uma curiosa e fascinante análise de palavras que existem (quase) somente em italiano… 

Conhecida também como a língua do sim, graças à conhecida divisão dos idiomas românicos na obra de Dante Alighieri, o italiano é há séculos repleta de termos poéticos, vocabulários multifacetados e palavras tão pontuais que não podem ser facilmente explicadas para quem não conhece essa língua, ou para quem busca traduzi-la com perfeição.

Como geralmente acontece em muitos sistemas linguísticos, de fato, existem conceitos enraizados de tal forma na cultural local ou com uma história etimológica tão característica que existem (quase) apenas no nosso país: a seguir, uma análise dedicada a alguns dos exemplos mais curiosos e fascinantes disso, para refletir sobre a unicidade dos ternos que usamos cotidianamente e conhecer melhor as suas origens.

Vamos nos debruçar, então, em algumas palavras italianas “intraduzíveis” em outras línguas:

Abbiocco

Termo italiano regional, cada vez mais difundido em toda a península, abbiocco é uma palavra que deriva de galinha, ou seja, um animal que, por excelência, está em uma posição recolhida, agachada, para chocar os ovos. A partir disso, começou a indicar uma pessoa que enrosca-se em si mesma porque está muito cansada, como já podíamos ler, por exemplo, no romance Meninos da vida, de Pier Paolo Pasolini. E assim, nos dias de hoje, o intraduzível abbiocco italiano define o comportamento de quem foi vencido pelo marasmo, principalmente depois de ter consumido uma farta refeição. Em inglês só é possível traduzir com um sintagma (food coma), assim como em francês (coup de pompe o coup de barre) e em muitas outras línguas estrangeiras.

Boh

Escutamos essa palavra ser pronunciada algumas tantas vezes ao dia e, contudo, a interjeição boh que comumente exprime para nós o conceito de incerteza é tudo, menos compreensível, em outras partes do mundo. Não existem, de fato, correspondentes tão rápidos e incisivos em outros sistemas linguísticos, especialmente se levamos em conta que além de significar não sei ou não tenho ideia, o monossílabo boh também pode exprimir o ceticismo de quem fala, ou até mesma a irritação, o desconcerto, a perplexidade. Por isso, há anos, circula nas redes manuais para o uso do boh, que ajudam quem está aprendendo italiano e quer se familiarizar com as nuances e com as possíveis exceções desta curiosa palavrinha.

Magari

Continuamos no tema das interjeições e focalizamos agora na palavra magari, proveniente do grego μακάριος (makàrios, pt. feliz) e que inserido em uma exclamação é sinônimo de eu adoraria, realmente gostaria, enquanto como função adverbial pode substituir o mais frequente forse (talvez). O seu fascínio reside na dificuldade de captar todas as possíveis implicações, a partir do momento em que, com base no contexto, pode exprimir uma sensação de esperança, de felicitação, de arrependimento, ou de dúvida: esse é o motivo pelo qual em línguas como o inglês, por exemplo, podemos traduzi-lo como if only, mas também como I wish ou ainda como you wish, sem que exista, contudo, apenas um correspondente igualmente polissêmico.

Meriggiare

Meriggiare pallido e assorto / presso un rovente muro d’orto, / ascoltare tra i pruni e gli sterpi / schiocchi di merli, frusci di serpi: é assim que se abre uma poesia de Eugenio Montale, na qual o protagonista é justamente esse vocabulário áulico, mas atualmente em desuso, tão amado pelos intelectuais italianos desde Burchiello até chegar, no século passado, ao já mencionado escritor genovês e ao “poeta vate” Gabriele D’Annunzio. Trata-se, neste caso, de uma condição comportamental, que mais detalhadamente significa em repouso e na sombra das primeiras horas de uma tarde de sol. Em outras palavras, em um estado de calmaria, em contato com a natureza.

Mica

E sempre a propósito de palavras italianas “intraduzíveis” em outras línguas, talvez não todos saibam que em latim a mica equivalia a uma migalha de pão, exatamente com acontece ainda hoje em algumas zonas do norte da Itália, nas quais a michetta é um precioso tipo de pão. E como uma migalha, na atualidade, mica tornou-se um advérbio que pode ser encontrado em qualquer lugar, de perguntas a exclamações enfáticas. A sua função, de fato, é aquela de reforçar uma negação (exemplo: não sei mesmo quem é o assassino deste livro), que, consequentemente não é nem um pouco fácil de traduzir: em inglês se poderia recorrer a it’s not as if, at all, certainly e afins, mas se tratam sempre de perífrases genéricas e bem mais longas, que não correspondem totalmente ao original.

Struggimento

Vamos concluir com um substantivo de retrogosto melancólico e romântico, o struggimento, cuja etimologia está relacionada ao verbo latino destruere. Se considerarmos que antigamente a palavra significava desfazer, liquefazer ou reduzir a nada, entendemos facilmente como hoje, em italiano, esteja associada à ideia de um pensamento nostálgico e impossível de realizar, que consome pouco a pouco tanto a nossa mente quanto o nosso corpo, e que geralmente se deve a um amor atormentado. Pode parecer estranho, contudo não são muitas as línguas nas quais se pode expressar a mesma faceta da dor com um substantivo tão específico que não seja, por exemplo, um genérico heartache ou torment.


Gostou desta tradução? Não deixa de me contar nos comentários se você já conhecia alguma das palavras apresentadas aqui e como você as traduziria para o português.

Dia mundial do livro: 8 motivos pelos quais livros melhoram a sua vida [tradução 25]

Que eu sou apaixonada por livros, isso não é segredo para ninguém. Mas sou muito ruim com datas literárias e, por pouco, não perco o timing desta tradução.

Procurando algo bacana para trazer aqui, encontrei este artigo escrito por Federica Ponza, em 23 de abril de 2019, e publicado no site Solo Libri.

Abaixo você encontra a tradução desse artigo, com 8 motivos pelos quais, de acordo com Federica Ponza, os livros melhoram a nossa vida


No dia 23 de abril é celebrada o dia mundial do livro e achamos que não há ocasião melhor para elencar os motivos pelos quais os livros tornam a sua vida melhor.

Os leitores sabem que um livro pode fazer a diferença na vida e cada um tem os seus motivos para amá-los, mas existem alguns que mais ou menos acomunam todos aqueles que são apaixonados pela leitura e pelos livros.

O dia mundial do livro e dos direitos autorais é um evento patrocinado pela UNESCO e que nasceu para promover e incentivar a leitura, a publicação dos livros, além da proteção da propriedade intelectual com o copyright.

Agora, mais que nunca, é bom lembrar quais são os motivos para escolher ler ou comprar um livro, mesmo à luz dos últimos dados do ISTAT sobre a leitura, que não deixam um quadro muito encorajador. Por esse motivo, aqui vão alguns motivos pelos quais os livros melhoram a vida.

1. Nunca te deixam sozinho/a

“Os livros, eles nunca te abandonam. Você certamente os abandona vez ou outra, os livros, os traí também; eles, pelo contrário, não te viram jamais as costas: no mais completo silêncio e con imensa humildade, eles te esperam sobre as prateleiras” (Amos Oz)

Um leitor sabe bem: com um livro na bolsa, a solidão desaparece ou assume um significado totalmente diferente.

Os livros, de fato, têm essa maravilhosa capacidade de te manter sempre acompanhado: quem poderia se sentir só e abandonado quando passa suas horas em companhia de belíssimos personagens que a literatura sabe e soube nos presentear?

Um leitor não teme a solidão, mas sabe apreciá-la e desfrutá-la ao máximo para mergulhar nas páginas de um lindo livro e viver uma nova aventura.

2. O cheiro das páginas esconde o segredo da felicidade

“Entre na livraria e aspire aquele cheiro de papel e magia que, inexplicavelmente, ninguém ainda pensou em engarrafar” (Carlos Ruiz Zafón)

Cada leitor verdadeiro sabe que no cheiro das páginas dos livros se esconde o segredo da felicidade: basta abrir um livro e mergulhar o nariz dentro das páginas para sentir uma inexplicável sensação de alegria e paz com o mundo.

Não importa se são livros novos ou usados, quando abrimos um livro, sentimos sempre uma grande e (aparentemente) inexplicável alegria.

Em suma, diante do cheiro das páginas dos livros não existe chateação ou mau humor que resista: o sorriso volta imediatamente aos lábios.

3. Te levam para onde você quiser

“Esta longa viagem imóvel que chamamos de leitura” (Guy Goffette)

Um livro sabe te fazer viajar e ir longe, mesmo estando sempre no mesmo lugar. Uma das maiores qualidades de um livro, de fato, é que eles são capazes de te levar onde for: quer seja na floresta da Malásia, com Sandokan, quer seja entre os corredores de uma escola de magia, com Harry Potter, os lugares nos quais te permite viajar são realmente infinitos.

4. Te ajudam a conhecer melhor a você mesmo/a

“Cada leitor, quando lê, lê a si mesmo. A obra do escritor é apenas uma espécie de instrumento ótico oferecido ao leitor para lhe permitir discernir o que, sem ela, talvez não pudesse ver em si mesmo” (Marcel Proust)

Acontece com frequência de lermos um livro e encontrarmos algo que fala de nós mesmos: você não entende como os personagens e as histórias são parecidas àquelas da sua vida ou mesmo quando completamente diferentes, encontram um modo de te revelar algo a mais sobre aquilo que você é.

Muitos leitores, aliás, se surpreendem pensando em si mesmos ou nos eventos da própria vida de maneira diferente depois da leitura de um belo livro. E, em muitas ocasiões, ler um livro pode concretamente fazer a diferença na vida e nas experiências das pessoas. Experimente para acreditar.

5. Te presenteiam com novos olhos para enxergar o mundo

Os livros têm a grande qualidade de te impulsionar a ver o mundo ao seu redor de modo diferente: cada um deles sabe te presentear com novos olhos para observar, abrindo portas e mundos que você não achava que fossem possíveis.

Uma qualidade não pequena, principalmente para aquelas pessoas que são naturalmente curiosas e amam ver as coisas de todos os pontos de vista possíveis.

Um livro, com efeito, contém o ponto de vista de um outro alguém sobre as coisas: se você parar para pensar, são um dos poucos instrumentos que te permitem realmente se colocar no lugar do outro e olhar através dos seus olhos.

6. Abrem a mente e o coração

“Os livros me enchiam a cabeça e alargavam a testa. Lê-los era como desencalhar o barco: o nariz era a proa; as linha, ondas” (Erri De Luca)

Um livro tem um poder realmente imenso: aquele de abrir seja a mente, seja o coração:

  • A mente porque te ajuda a conhecer novas coisas e a aprender sempre mais, mantendo o cérebro ativo e fazendo com que a sua cabeça não pare nunca de trabalhar da melhor maneira possível.
  • O coração porque, através das emoções que as histórias contidas nele sabem desapertar, pode-se experimentar todas as sensações que o ser humano conhece e vive.

Amor, medo, ternura, ansiedade, tristeza, alegria: de página em página, em uma viagem realmente única.

7. Te fazem viver muitas vidas

“Quem não lê, aos 70 anos terá vivido uma só vida: a própria. Quem lê, terá vivido 5000 anos: era vivo quando Caim matou Abel, quando Renzo casou com Lucia, quando Leopardi admirava o infinito… porque a leitura é uma imortalidade de trás para frente” (Umberto Eco)

Nada de mais verdadeiro: ser leitor de livros significa estender a própria existência a infinitas outras, vivendo todas aquelas dos personagens que se encontrarão entre uma página e outra. 

Sem exageros, os livros são uma das poucas coisas que te permitem se aproximar à sensação de infinito.

8. São companheiros de vida extraordinários

“Você entende que leu um bom livro quando vira a última página e se sente como se tivesse perdido um amigo” (Paul Sweeney)

Quem ama ler livros não tem dúvidas: estão entre as melhores companhias que se pode ter! Eliminam o tédio, apagam a solidão, te fazer conhecer pessoas extraordinárias (de verdade ou inventadas), fazem você se apaixonar, são os seus melhores amigos, te dão alegria, te fazem refletir, te acompanham em cada viagem ou experiência, te fazem se sentir abraçado.

Essas são algumas das características que tornam os livros companheiros de vida realmente extraordinários, como um verdadeiro amigo que você conhece a vida toda e que está sempre ali por você. Um amor para toda a vida.

Agora que te demos os nossos motivos pelos quais um livro pode melhorar a sua vida, nos conte quais são os seus nos comentários deste artigo.


E aí, qual é a sua opinião? Acha que ficou faltando algo nessa lista? Então não deixe de comentar!

Algumas considerações sobre grupos de leitura [tradução 24]

Imersa no segmento literário das redes sociais, muitas foram as vezes que vi chamadas para leituras coletivas e clubes de leitura. Nunca tive coragem, porém, de me aventurar nesses universos.

Reconheço, contudo, que essas práticas têm muito a agregar e trazem inúmeros benefícios a seus participantes e, por isso, hoje resolvi trazer a tradução de um artigo que fala justamente sobre essa temática.

O texto original foi escrito por Morgan Palmas, em 30/10/2009, no site Sul Romanzo, e você pode conferi-lo aqui. Apesar de publicado há anos, é impressionante como ele continua atual e certeiro.


Na Itália, a prática da leitura está em declínio, como se sabe, mas, por outro lado — ou talvez justamente por isso — percebe-se, por parte de quem lê habitualmente, uma forte necessidade de encontrar-se e dividi-la. Porque essa categoria de pessoa existe e é bem presente, mesmo que rara: cada biblioteca ou livraria tem os seus habitués, talvez apenas um ou dois, mas eles são muito presentes, amam os livros e amam falar de livros.

Na esteira de um hábito difundido principalmente em países anglófanos e hispânicos, estão espalhando-se entre nós, então, aqueles que são chamados Grupos de Leitura.

Moda? Imitação?

Claro, às vezes o pontapé inicial para a criação de um grupo também pode ser esse, mas muitas vezes reunir-se é uma necessidade real dos indivíduos para compartilhar interesses e paixões

Mas o que é um Grupo de Leitura?

É uma ponte entre a leitura individual e aquela coletiva.

No primeiro caso temos um leitor sozinho consigo mesmo e o seu livro em uma leitura silenciosa e íntima. No segundo, uma ou mais pessoas que se alternam lendo em voz alta um texto para os outros.

No Grupo de Leitura, “mais pessoas leem ao mesmo tempo um livro” (para usar uma definição agora consolidada) e depois se reúnem para discutir, juntas, sensações e problemáticas que ele provocou nelas.

O objetivo é justamente aprofundar e enriquecer-se mutuamente em uma análise de leitura não imposta (como pode acabar sendo uma palestra crítica ou mesmo uma leitura coletiva), mas elaborada pelo indivíduo e desenvolvida na pluralidade.

Aquilo que move as pessoas a juntar-se, além disso, é o interesse pela leitura em si, não circunscrita a um único texto ou livro.

Mas onde e quando se reúne um Grupo de Leitura?

Não há a necessidade de sedes especiais: na prática, basta um cômodo tranquilo com um círculo de cadeiras, de modo que todos possam olhar-se cara a cara. Geralmente quem patrocina ou propõe a iniciativa é uma Biblioteca ou uma Livraria, mas também conheço Grupos de Leitura que se encontram em Círculos Culturais ou Associações várias. Não é o lugar que cria o grupo, mas a vontade de se encontrar. No verão, uma solução simpática pode ser um jardim ou um quintal sombreado.

O único requisito é a vontade e a disponibilidade para ouvir e compartilhar.

A frequência (semanal, mensal ou qual for) é decidida pelo grupo mesmo, conforme os tempos e as exigências dos participantes.

Que regras deve ter um Grupo de Leitura?

No âmbito inglês foi elaborado um regulamento muito rígido, mas, pessoalmente, acho isso um pouco limitante. Acho que para além das regras comuns da boa educação, depende do grupo se autodeterminar as regras adequadas ao próprio caso.

De maneira geral, vale aquela (bem óbvia) de que só quem leu o livro pode pedir a palavra, mas as perguntas ou intervenções mesmo de quem não leu podem ser escutadas, principalmente quando se abordam temas mais gerais retirados da leitura.

Um coordenador pode ser útil, sobretudo no começo, e para fazer e atualizar a lista dos participantes (caso desejem fazê-la para simplificar as eventuais comunicações entre um encontro e outro) e gerenciar as questões práticas relacionadas, por exemplo, ao local. O importante é que a pessoa tenha a capacidade de permanecer no círculo, de ser justo com os outros, sem abuso e sem firmar-se como centro da reunião, caso contrário tudo descamba em uma exposição passiva, não em uma participação coral.

É importante lembrar que cada grupo é um mundo em si, em contínua evolução, depende somente da vontade dos participantes que podem mudar, suceder-se, alterna-se nos vários encontros.

Mas como se escolhe um livro?

O grupo o escolhe. Pela maioria, fazendo uma seleção entre alguns propostos, ao acaso pela internet, seguindo um gênero ou uma temática… Pode-se elaborar um calendário sazonal, por exemplo, ou estabelecer a cada encontro.

O importante é que sejam textos que podem gerar discussões dentro do grupo.

Em geral, para a primeira reunião, aqueles de quem parte a iniciativa escolhem um livro que sabem que podem interessar o maior número de pessoas, não para impor as coisas, mas justamente para dar o pontapé inicial e quebrar o gelo.

Quem participa de um Grupo de Leitura?

Quem ama ler e falar sobre aquilo que leu. Bastam duas pessoas (em tese) para formar um Grupo. Obviamente, quanto mais pessoas participam, mais se sente o enriquecimento, mas também só de poder falar com outra pessoa já é positivo.

Geralmente, a predominância feminina nesses encontros é esmagadora.

Mas, em resumo, por que eu deveria participar de um Grupo de Leitura?

Para além do simples prazer de compartilhar e comunicar para os outros as próprias impressões, pode-se encontrar um enriquecimento pessoal inesperado.

Impelidos pela vontade de participar, podemos encontrar livros ou gêneros que jamais, por preconceito ou outros motivos, teríamos aberto ou que jamais teríamos ido além das primeiras páginas por nossa própria conta. Acontece. Como pode acontecer de descobrirmos que gostamos ou que ao menos valia a pena lê-los.

Quando lemos, colocamos muito de nós na leitura, notamos detalhes, interpretamos fatos. Mas as chaves de leitura são diversas e incontáveis: perceber, através dos comentários sobre o mesmo texto, fatos dos outros, com outros percursos e outros pontos de vista é muito estimulante e ajuda a expandir os horizontes. De repente, sentimos vontade de reler, de perceber coisas que nos fugiram. Ou, por outro lado, destacar aquilo que fugiu aos outros. Ou aprofundar por nossa conta temas não abordados antes.

Um diferencial pode ser, durante a reunião, a leitura de frases ou pequenos trechos que os participantes tenham achado, de alguma maneira, estimulantes para a conversação.

Em geral, discutir junto permite refletir sobre o quanto se leu, não esquecer de imediato, mas elaborar a leitura e focar melhor os conceitos e sensações. Parar, apropriar-se de tempos que muitas vezes perdemos, arrastados pela fúria do fazer.

Enfim, para retomar o início do discurso, reunir-se dá a sensação de não estar sozinho em uma ocupação tão pouco considerada nos dias de hoje, que é a leitura.

Vale reiterar que ler não é inútil.

Na internet, muitos são os sites que se ocupam de Grupos de Leitura ou que os organizam, lembro, dentre estes: http://gruppodilettura.wordpress.com/


Ufa, chegou até aqui? Qual é a sua opinião sobre grupos de leitura? Participa de algum?

Quero aproveitar o tema para deixar uma super dica para você que, além de ler, estuda italiano: conheça o grupo de leitura Leggiamo Tutti e se inscreva! O primeiro encontro será dia 12 de março, não fique de fora.

Ler é bom, por que nós não gostamos? [tradução 18]

Dia desses vi alguém comentando que hoje, mais do que nunca, ler é importante. Difícil discordar, né? Quer dizer, acho que ler sempre foi importante, mas às vezes a gente perde a dimensão do quanto um livro pode nos abrir muitas portas. Por outro lado, sabemos como existem muitos não leitores por aí, mesmo com tantos estudos e publicações que demonstram os benefícios que esse hábito nos traz.

E foi pensando nessas questões que me deparei com um texto (quase uma entrevista de uma pergunta só) que achei muito interessante e que acrescentou alguns pontos à minha reflexão, principalmente por mencionar o papel das escolas (e, em menor grau, dos pais) nisso tudo. O texto em questão foi publicado com o título “Leggere è bello, perché non ci piace?”, no Popolis, em 25 de julho de 2002 e, abaixo, você poderá ler a tradução que fiz dele.

Antes, porém, gostaria de ressaltar que talvez a opinião do autor possa gerar uma pequena polêmica, ainda mais se pensarmos no contexto brasileiro, que carece de tantas coisas: investimento material e intelectual, incentivos, formação adequada… Ainda assim, acredito que podemos retirar dessas palavras uma reflexão válida e que pode nos ajudar a encontrar um norte interessante e, quem sabe, até mais eficiente para o incentivo à leitura.


Prezado Mario Lodi, somos estudantes da IV de Bùssero, na província de Milão. Sabemos que ler é bom, mas nem todos nós lemos sempre de boa vontade e espontaneamente, mesmo sabendo que isso é importante para aprender a nos expressar de maneira correta, para experimentar novas emoções, enriquecer a nossa fantasia, sonhar e estimular nosso pensamento e criatividade. Por quê?

Responde Mario Lodi

Caros amigos, vivemos em um tempo em que se lê cada vez menos, sejamos adultos ou crianças. O fenômeno do abandono da leitura por parte dos jovens americanos havia se tornando quase generalizado e a opinião pública pensava que fosse por causa da televisão.

O psicólogo Bruno Bettelheim, com um grupo de outros cientistas, estudou o problema e publicou os resultados da pesquisa em um livro, traduzido também na Itália, com o título “Imparare a leggere” [aprender a ler] (Editora Feltrinelli). Eles descobriram que a culpa do abandono da leitura não era da televisão, mas da escola, ou melhor, do primeiro livro que a primeira professora oferece à criança na primeira aula, no momento “mágico” no qual ensina a usar os sinais alfabéticos para ler e escrever. Naquele momento, diz Bettelheim, as crianças estão prontas para entrar, através da leitura, nos jardins da cultura, com os livros mais lindos que existem.

As escolas, porém, oferecem às crianças de quase todo o mundo os livros mais chatos que existem, aqueles escolares, iguais para todos. Então as crianças, que são curiosas de tudo, recorrem à televisão. Mas se elas tivessem descoberto de início os bons livros, a leitura se tornaria a mais bela aventura criativa, e uma necessidade. Os pais e os professores, portanto, deveriam substituir os textos escolares e chatos, pelos livros mais lindos e adaptados às crianças de todas as idades.

E quando encontram um, deveriam ler junto, sem fazer exercícios de gramática, e depois procurar outro, e depois outro… Assim nascerá a vontade dos livros como descoberta do mundo real e fantástico. Quem não teve a sorte de, imediatamente, ler bons livros, prefere a TV, mais cômoda, e torna-se preguiçoso diante do monitor. A sua fantasia adormece, o seu pensamento para. E quando o pensamento para é quase impossível colocá-lo em movimento novamente. Boas leituras, caros amigos.


E aí, qual é a sua opinião sobre isso? Não deixe de me contar nos comentários!

“Musica leggerissima” o significado da música de Colapesce e Di Martino [tradução 17]

Se tem uma coisa que eu adoro é poder usar música nas minhas aulas. E faço isso não apenas pelo fato de que eu sempre gostei de música, mas também porque é bem comum os próprios alunos pedirem indicações. Então, ao invés de simplesmente jogar um monte de informação de uma vez, vou compartilhando as poucos as músicas que conheço ou vou conhecendo.

Tento sempre buscar músicas que tenham a ver com o assunto da aula em questão ou então que usem muito alguma construção que será trabalhada, o que pode ajudá-los a entender e praticar tal construção. Mas, para não correr o risco de transformar as músicas em um mero instrumento gramatical, também gosto de entender o texto de cada uma, pesquisando seus possíveis significados. É impressionante o quanto já me surpreendi com músicas que diziam muito mais do que parecia em um primeiro momento.

Foi em meio a essas pesquisas que encontrei o texto que traduzirei aqui. Estava procurando sobre Musica leggerissima, uma das participantes do Festival de Sanremo de 2021. Esse é o mais importante festival de música italiana e esta é uma daquelas canções que ficam na nossa cabeça por alguns dias e que dá muita vontade de sair dançando, o que faz jus ao nome da canção.

Para além disso, porém, eu já adorava o fato de que é uma música sobre música e que usa termos do léxico musical — não apenas o leggerissima, que seria um tipo de música e que aqui traduzirei como música pop, mas também termos como crescendo, que pode ser encontrado em partituras, além de nomes de instrumentos musicais e situações nas quais costumamos ouvir música.

Foi só pesquisando um pouco, porém, que percebi que havia muito mais naquelas palavras. E acho que o artigo que traduzirei abaixo, escrito por Eleonora Damiani e publicado em 15 de março de 2021, neste site, já nos dá uma dimensão de como há profundidade em Musica leggerissima.


Italo Calvino dizia que “leveza não é superficialidade, mas planar acima das coisas, não ter pedras no coração”. Encontramos esse mesmo sentido de leveza no texto de Sanremo 2021 de Lorenzo Urcillo, conhecido como Colapesce, e de Antonio Di Martino.

É muito fácil cair na armadilha de etiquetar alguém como “superficial”, não vendo o quanto a pessoa que temos diante de nós está cheia de precisar permanecer na superfície das coisas para sobreviver. De fato, nem todos nós somo dotados de uma máscara e um cilindro de oxigênio que nos permitem descer às profundezas e quando o mar interior se mostra escuro, agitado e cheio de elementos que parecem assustadores, podemos apenas sentir a necessidade de permanecer na superfície. O mesmo vale para quando começa a acabar o fornecimento do cilindro e a pessoa sente a necessidade de subir novamente.

“Cantam-na os soldados, os filhos alcoolizados, os padres progressistas”

Seja o soldado em meio à guerra, seja o filho que depende do álcool, seja o padre que precisa combater pelos direitos humanos em uma Igreja ancorada no julgamento, têm-se em comum um elemento: todos se encontram lutando, seja em casa, seja no trabalho ou no fronte, pelos direitos humanos próprios e dos outros e justamente as lutas mais difíceis são cheias de sangue e lama.

TODOS NÓS TEMOS A NECESSIDADE DE VOLTAR PARA A SUPERFÍCIE

O ser humano não é feito para ficar muito tempo submerso na dor profunda. A mente precisa, de vez em quando, voltar à superfície, tomar um ar e isolar-se em suas zonas confortáveis. O termo “autista”, nos dias de hoje, nos faz imediatamente pensar no Distúrbio do Espectro Autista, mas cada um de nós tem uma zona de conforto, uma pequena zona autista salvadora, na qual podemos encontrar um pouco de espaço para fugir da dor quando ela se torna sufocante. Essa é a mensagem que parece nos transmitir Musica leggerissima: o ser humano precisa flutuar ou surfar sobre uma vivência interna emotiva que poderia nos levar para baixo como os pesos nas laterais de um mergulhador.

O buraco negro é algo que absorve, um lugar indefinido onde podemos nos perder para sempre, mas somente se o vemos assim. Na verdade, por mais que nos assustemos, os nossos lados mais profundos não são buracos negros, mas podem ser percebidos assim porque são intocáveis. As nossas partes escondidas, que fazem parte de nós, são mais parecidas a um abismo e do abismo pode-se voltar, munindo-se das ferramentas necessárias.

COLOQUE UM POUCO DE MÚSICA POP…

Coloque um pouco de música pop porque não estou com vontade de nada, ou melhor, muito pop, palavras sem mistério, alegre mas não muito é o pedido de que está sobrecarregado de vivências interiores pesadas e precisa enlevezar-se, não conseguindo entrar ou permanecer na profundidade.

Nós escavamos o buraco negro quando permitimos que pensamentos depreciativos tomem conta de nós, como repense sua vida, as coisas que você deixou cair no espaço da sua indiferença selvagem. Conseguimos transformar dentro de nós os irreparáveis buracos negros em abismos exploráveis a ponto de poder escutar e aceitar aquela nossa parte que, de tempos em tempos, precisa de música pop?