O bêbado e o equilibrista – João Bosco & Aldir Blanc

bêbado

O bêbado e o equilibrista  é mais uma música importante  na História do Brasil e também ficou famosa na voz de Elis Regina (não deixe de conferir Como nossos pais). Esta música foi lançada em 1978 e, apesar do forte teor político, nasceu do desejo de João Bosco em homenagear Charles Chaplin (explicitamente citado na figura de Carlitos), que havia morrido no Natal do ano anterior.

Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto
Me lembrou Carlitos
A lua tal qual a dona do bordel
Pedia a cada estrela fria
Um brilho de aluguel

Passados 40 anos dessa música, não podemos negar que ela ainda carrega certa atualidade, presente desde sua primeira frase: “caía a tarde feito um viaduto”. Quem mora em São Paulo ou acompanha as notícias daqui sabe que muitas pontes precisam de manutenção urgente e que, recentemente, numa madrugada de novembro, um viaduto cedeu e encontra-se interditado até hoje.

Mas O bêbado e o equilibrista tornou-se hino da anistia por ter uma letra extremamente representativa.

E nuvens lá no mata-borrão do céu
Chupavam manchas torturadas
Que sufoco!
Louco!
O bêbado com chapéu-coco
Fazia irreverências mil
Pra noite do Brasil

Na canção, o “mata-borrão” é, na realidade, um “apelido” dado ao DOI-CODI, o órgão máximo da repressão que existiu durante a ditadura militar brasileira. Sua função era combater os “inimigos internos”. Era o DOI-CODI, portanto, que originava as “manchas torturadas”.

Um nacionalismo exacerbado, a ponto de fazer “irreverências mil” só era imaginável na figura de um bêbado, e a figura do chapéu-coco nos remete, novamente, a Charles Chaplin em seu personagem bêbado, Carlitos.

Meu Brasil
Que sonha com a volta do irmão do Henfil
Com tanta gente que partiu
Num rabo de foguete
Chora
A nossa Pátria mãe gentil
Choram Marias e Clarisses
No solo do Brasil

Esses são, em minha opinião, os versos mais importantes e históricos dessa música, versos em que entram verdadeiras figuras brasileiras que marcaram o período de lutas:  o “irmão do Henfil” era Betinho, ativista brasileiro que lutou pela reforma agrária e ficou muito conhecido pelo projeto “Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida”; as “Marias” poderiam ser tantas mulheres, aqui representadas pela mãe de Manuel Fiel Filho, torturado e morto durante a ditadura militar; o mesmo acontece com as “Clarisses”, mulheres representadas pela figura da esposa do jornalista Vladimir Herzog, também torturado e morto durante a ditadura. As lágrimas, portanto, não precisam ser explicadas.

Mas sei que uma dor assim pungente
Não há de ser inutilmente
A esperança
Dança na corda bamba de sombrinha
E em cada passo dessa linha
Pode se machucar

Se voltarmos ao título da música veremos que além do bêbado, que já apareceu algumas vezes na canção, temos também a imagem de um equilibrista. Apenas nos versos finais chegamos a essa personagem: o que se equilibra, apesar de tudo, é a esperança. Na tênue linha que existe, a esperança resiste, ainda que o futuro seja imprevisível.

Azar!
A esperança equilibrista
Sabe que o show de todo artista
Tem que continuar

Ao trazer a figura de Carlitos e do equilibrista, esta música reúne imagens do campo artístico, que é um dos primeiros a sofrer em tempos de repressão. Mas “o show de todo artista tem que continuar” e eles o fazem com maestria, mesmo diante das situações mais desfavoráveis.

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2 comentários em “O bêbado e o equilibrista – João Bosco & Aldir Blanc

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